quarta-feira, 1 de abril de 2015
E “O PÃO NOSSO DE CADA DIA”? SÓ PRA QUEM TEM DINHEIRO?
Por Juracy Andrade
Já são mais de 2
mil anos de pregação do Evangelho, mas os cristãos ou os que se dizem tais
continuam perdidos em meio ao tiroteio de barbaridades deste mundo, sobre o
qual Jesus Cristo disse que o seu Reino não é dele, do mundo. Após a floração
de fervor, de fé e de prática da fé do cristianismo primitivo, a Igreja
mundanizou-se nas cortes papais e dos príncipes assim ditos cristãos, nas
Cruzadas, primeiro grande ensaio do colonialismo ocidental, nos temíveis
tribunais da Santa Inquisição, na sua bênção à destruição de culturas milenares
que tinham o grave defeito de não serem europeias, como as dos maias, dos
incas, dos astecas. A Igreja se havia europeizado ao invés de se
universalizado. Abençoou também a escravização dos africanos no Novo Mundo.
Assim, há hoje
pessoas ditas cristãs que ainda vão a suas igrejas, cumprem alguns rituais, mas
o Evangelho é para elas algo muito distante, narrações de livros muito antigos
sem conexão com a vida quotidiana de cada um e das famílias. Saindo da igreja,
tratam seus empregados como se ainda estivessem na senzala, procuram levar
vantagem em tudo sem consideração com a ética, elegem candidatos que vão para o
Congresso fazer negócios e não têm nem ideia do que seja representação popular;
representam apenas seus financiadores de campanha política.
“O pão nosso de
cada dia” da velha oração virou metáfora apaziguadora de consciências. Comemos
fartamente sem maiores preocupações com os que passam fome, espezinhados por
fanáticos religiosos ou por aqueles que se apropriam da mais-valia, com a
consciência tranquila por estarem combatendo o comunismo ateu a papafigo. E,
cristãos ou não, estamos na era que Antônio Luiz Costa chama a da “fúria sem
argumentos”: a fúria das classes médias
tradicionais frustradas, exaltadas e preconceituosas, que se tornaram
parte da paisagem de uma América do Sul que teima em acabar com o colonialismo,
hoje apelidado de globalização. Ele explica que, em muitos dos nossos países,
viveu-se uma fase de prosperidade na qual uma parte das massas ascendeu
política e economicamente e conquistou novos direitos e inclusão social, com
auxílio e encorajamento de governos e partidos populares. Elas ameaçam agora
disputar espaços de lazer, trabalho e estudo com a classe média tradicional,
disputar posições mais bem pagas ou com poder e prestígio. Exigir serem tratadas
como iguais e porem sua marca no discurso político.
Daí a fúria
contra presidentes constitucionalmente eleitos, como Dilma e Maduro. Há alguns
anos atrás, bastava pedir socorro ao bondoso Tio Sam e chamar os militares, pretensos
tutores da sociedade e do Estado, a intervir; combatendo os povos a que juraram
proteger. Agora isso está mais difícil, com o fim da guerra fria, o
desprestígio mundial dos Estados Unidos devido a tantos malfeitos e a
desmoralização que as ditaduras representaram para os militares.
Nós cristãos
temos de voltar a ler e praticar o Evangelho, aproveitando agora que temos um
papa cristão e disposto a demolir o poder imperial do Vaticano e da Cúria
Romana.
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Juracy Andrade é
jornalista com formação em filosofia e teologia
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ESTADO LAICO INTEGRA DIREITOS HUMANOS
Por Juracy Andrade
Na contramão da liberdade de culto, algumas igrejas
protestantes e muitos políticos teimam em desconstruir o edifício do Estado
laico, tão frágil apesar de instituído constitucionalmente desde os albores da
República. A presidente Dilma, que inicia o segundo mandato com um governo do
Bradesco e dos ruralistas, corre a prestigiar a inauguração de mais um templo
(melhor dizendo, financeira) do autonomeado bispo Edir Macedo. Candidatos a
postos eletivos buscam avidamente o apoio de líderes protestantes e das assim
ditas “bancadas evangélicas”. Até ministérios são confiados a pastores. O do
Esporte, por exemplo, George Hilton, que de esporte entende tanto quanto o
comunista descafeinado Aldo Rebelo, ganhou a pasta por ser filiado ao PRB
(Partido Republicano Brasileiro, que ironia!), braço político de Macedo e de
sua teologia da prosperidade. Hilton é conhecido principalmente por ter sido
detido no Aeroporto da Pampulha (MG) com onze malas e mais umas caixas de
dinheiro.
A ONG Atletas pelo Brasil, que reúne dezenas de
jogadores de várias modalidades esportivas, incluindo Gustavo Borges (natação),
Hortência (basquete) e Ana Moser (vôlei), apitou em nota: “Infelizmente, há
anos, o Ministério do Esporte é usado na barganha política”. E tem mais: o
homem das caixas de dinheiro goza da simpatia dos herdeiros de João Havelange e
de Ricardo Teixeira na CBF, José Maria Marin e Marco Polo del Nero.
Bem, o meu objetivo não é falar de esportes, mas de
Estado republicano laico. Desde a mais longínqua antiguidade, a religião e os
deuses fizeram parte integrante do Estado, da sociedade, da cultura. Inclusive
entre os judeus. Tanto que um dos motivos do desentendimento e distância entre
judeus e cristãos é o fato de o nosso mestre Jesus Cristo pregar a extensão do
Reino de Deus a todos os povos da Terra. Fruto, no Ocidente, do iluminismo, do
enciclopedismo e da Revolução Francesa, o Estado laico ou secular é aquele que é
independente de qualquer organização ou confissão religiosa, em que as
autoridades políticas (de qualquer poder do Estado) não aderem publicamente a
nenhuma religião e onde as crenças religiosas não influem na política, no
governo, na administração.
É a definição mais clara e usual do conceito de Estado
Laico: Estado em que se prescinde, por exemplo, do ensino religioso e que é
independente de qualquer influência de qualquer religião. Claro que tudo isso
deve ser entendido dentro de um contexto de ampla liberdade de qualquer um e
qualquer agremiação religiosa, todos com direito à liberdade religiosa, isto é,
a praticar sua religião sem ser impedido pelo Estado.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada
pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948, inclui a
liberdade de religião para qualquer pessoa entre as que nela são proclamadas.
Em seu artigo 18, consta que toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento,
consciência e religião, direito que inclui a liberdade de mudar de religião ou
de crença, assim como liberdade de manifestar sua religião ou crença individual
e coletivamente, em público e privadamente, pelo ensinamento, a prática, o
culto e a observância.
Deve-se levar em conta, no entanto, conforme modernas
constituições, que a ordem pública é o limite para essas liberdades (tipo: o
meu direito termina quando começa o do outro). Os fiéis de uma confissão
religiosa são obrigados a respeitar os direitos humanos. O exercício da
liberdade religiosa não pode atentar contra a ordem pública. Abro uma digressão
para fazer dois comentários.
O primeiro se refere à barulheira de certas
manifestações religiosas, que tiram o sossego e o sono da vizinhança, invadindo
o espaço do direito alheio. E ao fato de o governo brasileiro ter sido levado a
instituir ensino religioso em escolas públicas (imposição dos assim ditos
evangélicos?). Além de o presidente Lula se ajoelhar aos pés do papa. Um chefe
de Estado não pode fazer isso, mesmo sendo católico.
O segundo é quanto a uma interpretação exagerada e
equivocada do que é ordem pública. Por exemplo, quando o governo direitista
francês de Nicolas Sarkozy proibiu as garotas muçulmanas de usar o véu na
escola e de portar símbolos religiosos. Um destempero. Mulheres católicas
usaram véu durante séculos. E os católicos não usam cruzes, os judeus não usam
a estrela de Davi, o quipá? Burca, sim, é justo proibir, pois, além de
anti-higiênico, a pessoa poderia carregar ali debaixo um arsenal. E, quando
digo isto, não estou associando muçulmanos a terrorismo. Quem praticou o
terrorismo de Hiroshima-Nagasaki? E o terrorismo das Cruzadas, da Inquisição,
do colonialismo?
No Brasil, a Igreja resmungou muito e demorou a aceitar
o laicismo do Estado republicano. Até hoje ainda há quem não aceite a
Constituição. Apesar de o Concílio Vaticano 2º haver proclamado, na declaração
Dignitatis humanae, que a Igreja aceita a liberdade religiosa. Mas muitas
confissões protestantes continuam brigando para tomar o Estado de assalto.
Muitos católicos também continuam defendendo símbolos como cruz em tribunais e
outras práticas que em nada contribuem para a manutenção de um Estado laico que
só fez bem à liberdade religiosa, à religião (qualquer uma) e à Igreja.
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Juracy Andrade é jornalista com formação em filosofia e
teologia
Postado por O PORTA-VOZ no O PORTA VOZ em 2/04/2015 08:25:00 PM
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TEREMOS ENFIM A TÃO ALMEJADA UNIDADE CRISTÃ?
Por Juracy Andrade
A proposta do papa
Francisco em prol da união das igrejas Católica Romana e Ortodoxa Grega é mais
uma das propostas renovadoras e recristianizadoras daquele que se apresenta aos
cristãos e ao mundo, não como o Sumo Pontífice (título pagão emprestado do imperador
romano), mas como o bispo de Roma (um título cristão bem singelo). Não se trata
de uma novidade. O Papa Montini (Paulo 6º) e outros já haviam feito gestos ecumênicos
em relação às igrejas ortodoxas Grega e Russa. A novidade é que o papa não
partiu de imposições e rendições, mas deseja uma autêntica união, ou reunião,
com base nos princípios comuns estabelecidos desde os primeiros séculos da Era
Cristã, incluindo os que se contêm no Símbolo de Niceia: unidade, santidade,
universalidade e apostolicidade (tradição apostólica).
Isso obrigará as diversas
igrejas que desejem a união, sejam ortodoxas, reformadas ou a de Roma, a muitas
renúncias. Sabemos que, mesmo depois do chamado cisma do século 10º, os papas
continuaram realizando concílios e proclamando unilateralmente dogmas de fé, o
que foi tornando cada vez mais difícil o reencontro daquela unidade tão
recomendada por Jesus Cristo. Embora o chamassem de ecumênicos, querendo
significar serem de toda a Igreja de Cristo. Também o outro lado teve seus concílios.
Houve de fato um concílio convocado por Roma que muito se aproximou do
ecumenismo cristão, sendo inclusive convidados para ele bispos não católicos
como ouvintes (o que houve também no Vaticano 1º; só que ninguém compareceu).
Foi o Vaticano 2º, de 1962 a 1964, praticamente ignorado pelos papas que vieram
depois, com exceção agora de Francisco que nele se apoia para muitas de suas
iniciativas.
Houve também, contudo,
concílios da desunião, como o de Trento (a chamada Contrarreforma, no século 16)
e o Vaticano 1º, no século 19. Convocado por Pio 9º em 1868, seu conteúdo
permaneceu envolto em mistério até que a revista dos jesuítas Civiltà Cattolica
anunciou o grande objetivo: a proclamação como dogma de fé da infalibilidade do
papa No ano seguinte, iniciava-se o concílio, que teve de ser interrompido em
julho do ano seguinte devido à eclosão de mais uma guerra entre a França e a
Alemanha, além da invasão de Roma pelos que lutavam pela unificação da Itália,
incluindo a tomada dos Estados pontifícios. Roma foi tomada pelos seguidores de
Mazzini e Garibaldi em julho de 1970. A proclamação da infalibilidade papal por
Pio 9º veio a despeito da não unanimidade de opiniões entre os padres
conciliares. Até hoje é mal digerida por católicos e, mais ainda, pelos
protestantes e ortodoxos.
Vamos torcer cristãmente
para que agora todas as igrejas realmente herdeiras da mensagem de Cristo
decidam atender ao apelo do nosso único Mestre, na véspera de sua morte,
voltando à unidade perdida.
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Juracy Andrade é jornalista
com formação em filosofia e teologia
CORREÇÃO: No penúltimo parágrafo, a tomada de Roma pelos garibaldinos não foi em 1970, mas em 1870.
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