terça-feira, 29 de dezembro de 2015

“A CULPA NÃO É MINHA; EU VOTEI NO AÉCIO”; NOVES FORA A ÉTICA DUVIDOSA DO NETINHO DE TANCREDO

Gente, continuo revendo “Viver é muito perigoso” e espero entregar a revisão a vocês brevemente. Estou pensando também em acrescentar a estas minhas postagens bissemanais uma postagem exclusivamente sobre economia, que seria escrita por um executivo de grande empresa paulistana. Outra que estou lhes devendo é iniciar, na coluna aí ao lado direito, as transcrições de meus artigos no Jornal do Commercio, coisa que abrange uns 25 anos.
Lendo a última edição deste ano de uma revista que é rebelde à assim dita “mídia nativa” (Carta Capital), descubro uma preciosidade do jornalista João Filho, que mantém na web um perfil intitulado Jornalismo Wando. Desde o ano passado, intensificando-se à medida que essa braba crise vai fustigando o Brasil, uma campanha pretende derrubar a presidente eleita. Arrefeceu um pouco após um freio de arrumação constitucional do STF e a descoberta de que adversários de Dilma, como o presidente da Câmara, o senador Aécio Neves, o xogum Fernando 2º não são exatamente vestais nem varões de Plutarco.
Uma camisetinha de grife destacou-se em manifestações que lembram a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, em São Paulo, preâmbulo do golpe civil-militar de 1964. Na camiseta lê-se: “A culpa não é minha; eu votei no Aécio”. (O mui politizado Ronaldo Fenômeno usava uma.) A ideia que pretende passar é a de que tudo seria diferente com a eleição do netinho de Tancredo. A culpa pela corrupção (imensa, não há dúvida, mas afinal apurada e punida) é daqueles que  não votaram nesse “bibelô da retidão moral”, como diz João Filho.
O jornalista aponta uma série de fatos (não factoides) a desmentir tanta honestidade. O primeiro é um aeroporto público construído em Cláudio (MG) dentro da fazenda de umm tio de Aécio, com acesso guardado por sobrinhos do então governador. O bibelô da retidão moral usou, quando no governo mineiro, aeronaves oficiais 1.430 vezes, muitas para fins particulares. Só no aroporto do Tio Múcio foram mais de cem pousos e decolagens.
Mas não foi só isso que o grande modelo dos “fora Dilma” fez. Deu caronas, às custas do contribuinte mineiro, a Ricardo Teixeira, o campeão da ética no futebol, José Serra, Ray Whelan (já estve preso em Bangu), Roberto Civita, Luciano Huck, Alexandre Accioly (parceiro de farras), Boni, Sandyjunior, Milton Gonçalves, Zé Wilker, FHC, Roberto Irineu Marinho etc. etc. etc.

Quando critico Aécio, não estou afirmando que o governo de Dilma está sendo uma maravilha. Tá muito ruim. Pode piorar. Pode melhorar. Oxalá! Mas o fato é que ela foi reeleita e, uma vez por todas, temos que respeitar a Constuição e o voto popular. Não podemos alimentar eternamente a cultura do golpe: proclamação da República, Constituição outorgada por Floriano Peixoto, Estado Novo, derrubada de Getúlio (golpe no golpe) às vésperas das eleições de 1945 (os generais fascistoides se vingaram por Getúlio ter se unido aos Aliados na 2ª Guerra Mundial), derrubada trágica de um Getúlio constitucionalmente eleito, em 1954, golpe frustrado contra Jango em 1961, e finalmente aquele golpe que pôs o Brasil em ordem unida por 21 anos, hoje tão homenageado e lembrado nas manifestações dos coxinhas.

sexta-feira, 25 de dezembro de 2015

SEM CONSTITUINTE EXCLUSIVA NÃO HÁ SALVAÇÃO

O panorama que conseguimos enxergar para 2016 é bem inquietante, mas temos o direito de esperar que nossos políticos, incluindo a presidente Dilma, criem juízo e funcionem melhor do que neste definhante 2015. O Congresso precisa agir como representante do povo, deixando de lado múltiplas patifarias, aprovando leis que possam nos tirar do atoleiro e elegendo líderes que não estejam implicados em malfeitos, sobretudo o presidente da Câmara, que consegue ser mais cínico na embromação que Paulo Maluf. E a chefe do Executivo não pode continuar esnobando políticos e empresários e ignorando a própria realidade nacional. Não bastará que ela aprenda a governar. Será necessário também que o Congresso a deixe governar.
É igualmente preciso que nós, cidadãos, eleitores, exerçamos nosso direito de vigiar os poderes constitucionais e cobrar deles que cumpram seus papéis, deixando de lado interesses pessoais. Tudo isso só será possível com uma constante e rápida elevação do nível educacional do brasileiro, que, como sabemos e sentimos na pele, ainda é baixíssimo. (Escrevi a propósito recentemente.) Somente aqui na América do Sul, perdemos para a Argentina, Chile, Uruguai. Nossos professores ganham mal, vivem mal e, consequentemente, são desmotivados. Despreparados quase sempre, pois uma simples graduação, sem especialização, reciclagem, não lhes permite o desempenho que seria necessário para elevar o nível geral do ensino.
Acredito que, não só esta elevação da qualidade do ensino, mas a solução de outros tantos demasiados problemas que a afligem o brasileiro só será viável com algumas muletas básicas que nunca tivemos pra valer. Uma delas é uma Constituinte exclusiva (Congresso investido de poderes constituintes nunca funcionou: políticos viciados em privilégios votam uma Constituinte viciada, como eles). Nunca tivemos uma. No pós-ditadura, quase conseguimos. Chegou-se a ter um esboço para servir de base às deliberações, feito pelo jurista Afonso Arinos. Mas prevaleceu a vontade dos políticos profissionais e aproveitadores. Resultado: uma Constituinte com algumas boas determinações, muitas que nunca foram regulamentadas, e a seguir tantas emendas casuísticas que agora ela parece mais uma colcha de retalhos desprestigiada.
Outra é termos, afinal, um pacto federativo. Com o golpe republicano (que país para gostar de golpe!), as províncias do Império, com pouquíssima autonomia, foram transformadas, num passe de mágica, em Estados extremamente dependentes do poder central. Jantaram a federação. E, como Pedro 1º havia feito no passado, o sanguinário Floriano Peixoto mandou os constituintes para casa e outorgou ao país uma Constituição a sua imagem e semelhança. Essa usurpação da vontade popular continuou depois da Revolução de 1930, no Estado Novo, em 1946, durante a ditadura de 1964-85, na redemocratização à la Sarney-Collor. O resultado é que hoje ser congressista virou um bom negócio e há uma boa quantidade de malandros disfarçados de representantes do povo. Assim não dá.

Como convocar uma Constituinte exclusiva? Creio que haverá maneiras legais de se fazer isso, por iniciativa popular ou, quem sabe, da Presidência da República. Com a palavra os juristas.

terça-feira, 22 de dezembro de 2015

VINTE SÉCULOS DE CRISTIANISMO. E O EVANGELHO?

"Adeste, fideles, laeti, triumphantes, venite, venite in Bethlehem. Natum videte, regem angelorum ...” (Vamos, fiéis, alegres, triunfantes, vinde, vinde a Belém. Vede o nascido que é o rei dos anjos ...). É um antiquíssimo canto natalino que é cantado por católicos romanos e protestantes através do mundo. Era; porque hoje do Natal religioso quase nada resta. Até a tradicional Missa do Galo foi deixada de lado, sob o pretexto da violência urbana sobretudo à noite. Virou missa do pinto mesmo, às 20 ou 22 horas. Mas não se deixa de ir a outras celebrações noturnas, como bares, baladas, boates, cinemas, teatros etc.
O importante no Natal hoje é o lado profano da festa: ruidosas confraternizações em que ninguém se sente frater (irmão), consumismo desenfreado mesmo com crise, troca de presentes e, finalmente, uma lauta ceia à meia-noite substituindo a Missa do Galo. Vinte séculos de cristianismo e o Evangelho está cada vez mais longe da realidade do mundo. Pobres, miseráveis mesmo, perambulando pelas ruas e a gente se fechando sempre mais a eles, a uma realidade desumana e anticristã.
É assim que é preciso ver o que se passa no momento. Nos últimos 13 anos, houve alguns avanços sociais, que tiraram muita gente da miséria absoluta. O que Gilberto Freyre chamava de casa-grande não gostou nada: já se viu um aeroporto com cara de rodoviária? Já se viu você sentar na sua poltrona no avião e ver junto uma pessoa com ar de pobre, de sandálias Havaianas? Para esses, a senzala não tem o direito de evoluir; só tem direito ao pelourinho e ao açoite. São avanços tão pequenos e precários, mas a casa-grande quer acabar com eles.
A casa-grande só ficará contente quando vir o Temer, o Aecinho ou, quem sabe, o Serra, no poder. Enquanto isso não chega, contenta-se com um Congresso dos mais amorais que já tivemos. E tem aí uns que se dizem neopentescostais, bancada evangélica (como em um Estado laico, pode-se misturar de tal modo religião com política?). O máximo expoente desse pessoal, Cunha, o presidente da Câmara dos Deputados, é um multicriminoso.
Amigas, amigos, qualquer que seja a nossa fé, vamos lutar para que tal situação não se sustente. Se partidos mais à esquerda que estão no poder desde 2003 perderam o trem da história, podem muito bem ser substituídos por outros que, como diz o papa Francisco, não sejam adoradores do deus Mercado, do deus Dinheiro;
Feliz Natal para todas e todos vocês e um 2016 dos melhores. Vocês merecem. Todos merecemos.

PS – Estou com dificuldade para fazer uma revisão de “Viver é muito perigoso”. Não consigo substituir o que está aí por capítulos revistos. Preciso me acostumar com novos programas. Vou fazer o trabalho em todos os capítulos e depois tentar colocar.

sábado, 19 de dezembro de 2015

A EDUCAÇÃO (OU FALTA DE) NA CASA DE MÃE JOANA

Há poucos dias, em entrevista à Rádio Jornal, o sr. João Carlos Paes Mendonça, líder do grupo JCPM e presidente do Sistema Jornal do Commercio, disse uma coisa básica, elementar para se entender a casa de mãe Joana que o nosso país se tornou. Falou simplesmente o seguinte: o Brasil não investe em educação. Que ninguém pense que eu estou querendo agradar ao patrão (tenho certeza que minhas leitoras e leitores não vão achar isso), pois eu não estou mais no Jornal do Commercio, a não ser por um artigo mensal, geralmente no primeiro sábado. Ali participei, durante mais de 20 anos, a convite de Ivanildo Sampaio, meu ex-colega no grupo Manchete, do soerguimento de uma empresa quase falida.
Com um salário em volta de mil reais, um professor não pode se manter decentemente, se reciclar, comprar os livros e outros materiais de que precisa para cumprir sua missão docente. As escolas, em geral, são ruins e mal administradas, além de expostas a constantes assaltos que, parece, não são percebidos pelos órgãos de segurança. A preciosa ajuda da internet não é levada em conta. Todo governo promete melhoras, mas no fim nada: prometem mundos e fundos e no fim ficam com os fundos imundos, como diz o povo.
Lembro-me de escolas que conheci na Europa, onde os alunos estudavam até grego e latim, que desapareceram do nosso ensino fundamental. Quando visitei meu filho Carlos Emanuel, num tempo que ele passou nos Estados Unidos, conheci a escola em que meu neto Pedro estudava (em Stamford, Estado de Connecticut, vizinho a Nova York), muito melhor do que algumas escolas particulares por aqui. São a Europa, os EUA, os países que investem em educação que ganham os prêmios Nobel, têm as melhores universidades, produzem ciência e tecnologia.
Nas nossas universidades, ao menos nas federais, os professores ganham melhor que no ensino fundamental. Por outro lado, se tornaram (na maioria) meros funcionários públicos, escudados numa estabilidade sem compromissos: não se veem obrigados a pesquisar, publicar produções científicas; às vezes queimam aulas. Muitos recebem mais por dedicação exclusiva e distribuem a “dedicação exclusiva” por mais de uma entidade.
Sem boa educação, não há conscientização de cidadania, de política. Você não reivindica seus direitos, não pratica seus deveres. Acha que tudo depende do Estado. Vende seu voto a quem der mais. Deixa-se corromper e também toma a iniciativa de pagar propina etc. Faz suas próprias leis; no trânsito, por exemplo. E, como os políticos, administradores também são geralmente deseducados, pouco fazem para evitar que a cidade, o país se tornem uma selva. Seria tão simples, por exemplo, colocar pardais para evitar que o motorista apressadinho invadisse o espaço exclusivo de ônibus. Mas, cadê? Quem segue a regra fica se sentindo um abestalhado.
Essa onda de estripulias com o dinheiro público, que afinal está sendo investigada e punida, também tem a ver com o baixo nível de educação do país. Recente reportagem de Angela Fernanda Belfort (JC de 13.12.15) mostra o impacto da corrupção em obras no Estado de Pernambuco no bem-estar da população. Transposição do Rio São Francisco: 12 milhões de nordestinos sem água em uma das piores secas da região. Estaleiro Atlântico Sul: 2,5 mil pessoas perderam seus empregos na onda da Lava-Jato. Na Refinaria Abreu e Lima, também roubalheira e desemprego.

É certo que, se houvesse investimento na educação, no ensino, o povo não aceitaria situação semelhante. Corrupção também há em países de alto nível educacional; mas ela é investigada, combatida, punida. O nosso problema maior é que quase todo mundo se dá bem nessa bandalheira. E se dava melhor ainda em governos em que o Ministério Público e a Polícia Federal não funcionavam. Esse pessoal se dá bem até demais desde que vivia à custa de trabalho escravo.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

ACHO QUE O ESTADO DA GUANABARA DEVE SER RESTAURADO

Prosseguindo com o tema da última postagem. Depois que o general-ditador Ernesto Geisel atropelou, mais uma vez, a Cidade Maravilhosa fundindo o Estado da Guanabara, criado depois que o Distrito Federal migrou para o Planalto Central, com o velho Estado do Rio, cuja capital sempre foi em Niterói, uma horda de corruptos e incompetentes tomou de assalto a velha e nobre cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro (que, apesar de tudo, "continua linda”, como cantaram Gil e Caetano antes de partirem para o exílio). Segundo um artigo do jornalista José Roberto Guzzo, de outubro de 2009, "o Rio de Janeiro se viu castigado por alguns dos piores governos já registrados na história humana".
Essa fusão arbitrariamente imposta lembra um processo inverso que aconteceu com a província de Pernambuco, quando perdemos Alagoas, que se tornou província autônoma, e a Comarca do São Francisco, que abrangia a margem esquerda desse rio. Mas ali não se constituiu uma nova província. Foi empurrada para Minas e depois para a Bahia. O Geisel daquele tempo, que se chamava Pedro 1º, não gostava de Pernambuco, que vivia fazendo revoluções contra o poder central, querendo república, federação, liberdade. É o único Estado que perdeu grande parte do seu território, não para criar um novo, como aconteceu com Goiás, Pará, Amazonas, mas para ser anexada a outro. E ficou por isso mesmo. Não se questionou mais o arbítrio. A não ser, quixotescamente, Barbosa Lima Sobrinho, em plena ditadura.
Não sei por que não se questiona agora, depois que voltou uma certa dose de democracia, essa fusão, que só interessava à ditadura e ao ditador do momento. A Cidade Maravilhosa só tem a perder com a continuação desse casamento suspeitoso, como diria Ariano Suassuna. A Justiça perdeu, como me contou um juiz aposentado da Guanabara, com a insegurança jurídica herdada de um Estado que não progredira (o Estado do Rio), com grande quantidade de magistrados viciados. A representação popular piorou de qualidade. No Executivo, em lugar de governadores qualificados como Carlos Lacerda, Negrão de Lima, Chagas Freitas, os fluminenses que vieram depois chafurdaram bastante na incompetência e também no desregramento.
Referi-me a Lacerda. Ele era golpista empedernido, mas um cara culto. E, na gestão dele, o Rio ganhou obras monumentais, como o Parque do Flamengo, o túnel que vai do Rio Comprido à Lagoa e o outro, menor, Catumbi-Laranjeiras. É verdade que recebeu muita ajuda da Aliança para o Progresso (Usaid), através da qual o governo dos Estados Unidos favorecia os governadores anti-Jango. Por outro lado, desmontou muitas favelas da Zona Sul, empurrando os pobres que ali moravam para subúrbios longínquos e com transporte precário.
Se eu ainda morasse no Rio, faria uma campanha constante para o divórcio dessa união viciada. Daria uma de Cícero, terminando todos os meus artigos na imprensa etc. com um "Ceterum censeo Carthaginem esse delendam", ("De mais a mais, acho que Cartago deve ser destruída"): Acho que o Estado da Guanabara deve ser restaurado. Dos meus colegas daquela época muitos já morreram. E a turma mais jovem talvez nem se lembre que sua cidade já foi um Estado. Isso me lembra Pelópidas da Silveira, um grande prefeito que o Recife teve. Ele falava que uma das coisas ruins de se ficar velho é que, quando a gente quer ver um amigo precisa ir ao cemitério.

Gente, revisei os três primeiros capítulos de "Viver é muito perigoso e acrescentei algumas coisas. Convido-os a conferir.

sábado, 12 de dezembro de 2015

CIDADE MARAVILHOSA ESVAZIADA POR JK E PELA DITADURA

Gente, confesso que tenho um amor à primeira vista pela cidade do Rio de Janeiro desde que a vi pela primeira vez, entrando de navio na Baía da Guanabara (num tempo em que ainda se viajava de navio, de trem, de bonde por aqui; hoje, trem e ônibus só na atrasada Europa...) a caminho do Rio Grande, onde estudaria filosofia com os jesuítas em São Leopoldo. Naquele tempo eu estudava para ser padre. Não ia dar certo. Alguns meses depois, consolidei esse amor passando férias ali, em dezembro de 1950 e janeiro de 1951, na casa de uma tia chamada Gracinha, que morava no Largo do Machado, esquina com Bento Lisboa. Ela mandou uma passagem para Mamãe, que veio do Recife, e outra pra mim. Getúlio, constitucionalmente reeleito, tomou posse em janeiro para um mandato que não terminaria, forçado que foi a suicidar-se para não enfrentar a desonra de um golpe (que conseguiu retardar por dez anos com sua carta-testamento). Eu ia muito à sede da Ação Católica, na Rua México, para ouvir conferências de Alceu Amoroso Lima, Dom Helder (que era bispo auxiliar do Rio) e outros líderes do catolicismo brasileiro. Na noite de Natal, fui assistir à Missa do Galo no Mosteiro de São Bento, pegando um bonde um pouco antes da meia-noite e saltando na Praça Mauá. Tudo tranquilo (a volta pra casa também), sem balas perdidas, arrastões nem o domínio do tráfico de entorpecentes. Rio saudoso.
Muito mais tarde, nos anos 1970, morei lá alguns anos, trabalhando no grupo da Manchete, na Rio Gráfica, hoje Editora Globo, no Diário de Notícias e no alternativo Opinião. Foi um tempo muito bom para mim, apesar do auge da ditadura (com as polícias ainda desconectadas, em São Paulo e no Rio minha pecaminosa vida pregressa era ignorada). Eu morava na Praia do Flamengo, onde descobri um apartamento havia muito desocupado e que estava barato, com vista para o Pão de Açúcar, Niterói do outro lado da baía. Meus meninos, menos Paulo (Marquinhos não havia nascido), ainda muito novo, estudavam em escola pública, de excelente qualidade, Escola Rodrigues Alves, vizinha ao Palácio do Catete, Depois Carlinhos passou para a Anne Frank, vizinha ao Palácio Guanabara. O hino do Estado da Guanabara era o velho e bonito "Cidade Maravilhosa, cheia de encantos mil".
Mas o que eu quero dizer mesmo é que o Rio de Janeiro foi duplamente esvaziado e apequenado. Primeiro, por JK, que cismou de construir Brasília, sem justificativa séria, somente a possibilidade das negociatas de sempre (o desenvolvimento do Centro-Oeste não se deve só à mudança da capital). Destruiu a Previdência Social e muito mais. Para desafogar o Centro do Rio, bastava instalar o governo federal na Barra da Tijuca, despovoada na época, onde caberia muito bem o núcleo dos projetos de Lúcio Costa e Niemeyer: Praça dos Três Poderes e Esplanada dos Ministérios. Nada das cidades-satélites faveladas, das infindáveis mordomias que JK inventou para convencer deputados e senadores a se mudarem para Brasília.  Nem das constantes vantagens que eles próprios criam o tempo todo.
Pelo menos, o Rio tornou-se uma Cidade-Estado. Mas tinha uma pedra (uma ditadura) no meio do caminho. E o general-ditador Ernesto Geisel decidiu juntar o Estado da Guanabara com o atrasado e despolitizado Estado do Rio. Aí foi o esvaziamento maior. E vieram os “Garotinhos”, “Garotinhas”, “Pezões”, trazendo para o politicamente conscientizado Rio-Guanabara a incultura política da velha província fluminense. Como o tema se alonga, volto a ele na próxima postagem.

terça-feira, 8 de dezembro de 2015

SECA EM ALDEIA? É ISSO AÍ. E TEM TAMBÉM A PRIVATARIA

Antigamente a seca era nos sertões, do Piauí ao norte de Minas, estendendo-se às vezes ao Agreste. Quando eu era criança, não me lembro de estiagem mais longa na Zona da Mata, onde meu pai, Paulino Veloso de Andrade, tinha um engenho, não muito longe das matas onde moro hoje, em Aldeia. Este ano, a seca atinge até Aldeia, onde não pinga há mais de um mês. Enquanto isso, representantes dos líderes mundiais discutem em Paris, sem chegar a conclusões satisfatórias, como conseguir que o nosso maltratado planeta Terra não atinja brevemente o talvez fatídico aquecimento até dois graus.
Mas, o que eu desejo tratar hoje é dos prejuízos que causa ao nosso Estado a não fiscalização, por exemplo, da concessionária de energia elétrica, torrada a preço de banana (como era costume nas privatizações dos anos 1990) e hoje controlada por um grupo visigodo. A Aneel e outras agências reguladoras criadas à época da desestatização desenfreada continuam ineficientes, mesmo após a saída do PSDB do governo federal, servindo praticamente para homologar aumentos de tarifas. Em recente reportagem de Emídia Felipe no JC, ficamos sabendo que o polo industrial de Goiana, onde se destacam a Hemobras e a Jeep, está sendo prejudicado por constantes falhas no fornecimento de energia. A fábrica do Renegade chega a parar várias vezes. Na Hemobras, as quedas de energia ameaçam o tratamento do plasma, sua matéria-prima. A Celpe sustenta que as interrupções são pontuais. Fico eu pensando, com meus botões, se, lá na Espanha, hoje reconduzida à Europa após a queda do fascismo franquista, os visigodos, que já foram bárbaros, daqueles que invadiram o Império Romano com a fúria de uma Estado Islâmico, produzem quedas, mesmo pontuais, de energia elétrica. Voltando a Aldeia. Aqui as quedas de energia são frequentes, sobretudo quando chove. Certamente custa caro a manutenção das redes e os visigodos precisam de mais lucros para os acionistas. E viva o capitalismo!
Voltando a Goiana. A Hemobras paga à Celpe uma média de R$150 mil mensais e registrou, de janeiro a 15 de novembro, 116 horas sem energia em sua fábrica, o que equivale a quase cinco dias. Essa empresa pública ainda não teve perda de plasma porque possui dois geradores que impedem o risco à matéria-prima usada na produção de hemoderivados. Na Jeep, uma comitiva da Assembleia Legislativa encontrou a fábrica sem energia. Interessante notar que a indústria de vidros Vivix e a de cerveja Itaipava (esta em Itapissuma) não se queixaram de falta de energia. Dá a impressão que a concessionária dos visigodos escolhe a quem vai prejudicar, pois não pretende diminuir o lucro dos acionistas fazendo boa manutenção em todas as redes.
Pode-se acreditar (claro que eles não vão confessar) que as concessionárias de telefonia celular também agem assim. Por exemplo, você faz uma ligação e começa a falar com outra pessoa. Quase invariavelmente, a ligação cai e você tem de gastar mais tentando outra ligação. É frequente, você ter de fazer três ligações, se a  conversa for mais longa (a Anatel não pia). Sem falar em apagões de linha prolongados. Com a TV por assinatura, nota-se que é muito mais cara que nos países de origem e oferece programas repetitivos. Se você quiser variar, tem de pagar mais.Tudo isso graças à assim dita "privataria tucana" (leiam o livro homônimo).
Caras leitoras e caros leitores, não esqueci o "Viver é muito perigoso" (aí ao lado). Vou retomar uma revisão para cobrir fatos e comentários que esqueci na primeira edição.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

QUAL É O ANIMAL QUE FAZ DE TUDO PARA DESTRUIR SEU HÁBITAT?

O ser humano se diz racional e civilizado. No entanto, faz coisas que o tornam inferior até aos animais irracionais. Qual a espécie que se autodestrói, guerreando-se constantemente; antigamente mais por território, hoje para manter ativa e lucrativa a indústria bélica? Qual é o animal que faz de tudo para destruir seu hábitat, o meio ambiente em geral, derrubando florestas, transformando rios e mares em lixeira e captação de esgotos? Qual é o animal que concentra para pouquíssimos tanto alimento, digamos riqueza? Agora mesmo os líderes mundiais e seus técnicos estão reunidos em Paris para ver se conseguem que o aquecimento global não ultrapasse dois graus. Cadê as geleiras, os glaciares? (Visite o Perito Moreno, no extremo sul da Argentina, antes que ele se acabe, poderia anunciar um cartaz turístico.) Cadê a fauna polar? Onde irão sobreviver os esquimós?
Faço estas considerações a propósito de nota lida em algum jornal sobre o excesso de agrotóxicos que se utiliza no Brasil. Agrotóxico, também conhecido como pesticida, designa compostos químicos  cujo princípio ativo acaba com diversos tipos de pestes agrícolas que prejudicam a produtividade desse setor, como insetos, ervas daninhas, fungos, vermes, roedores e pragas. De uma maneira geral, são tóxicos, uns mais, outros menos danosos à saúde humana e ao meio ambiente. Um dos problemas mais comuns que acarretam é a contaminação do solo, de lençóis freáticos, rios, lagos. O alcance do problema aumenta em se tratando de inseticidas com organoclorados e  e organofosforados, que permanecem no corpo do animal, por exemplo, no peixe, e são absorvidos por quem o come.
O impacto causado  pelo fabrico e uso de pesticidas é muitas vezes irreversível. Apesar de tudo, o nosso país é um dos maiores consumidores de agrotóxicos do mundo, com cerca de 70% dos alimentos atingidos. A grande justificativa para o império crescente do agrotóxico é que, com o aumento da população mundial, precisa-se de cada vez mais eficiência na produção agrícola para alimentar os homens. "Imagine tomar um galão de 5 litros de veneno a cada ano. É o que os brasileiros consomem anualmente", segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca). Desde 2008, o Brasil ocupa o primeiro lugar no ranking mundial de consumo de agrotóxicos.
Você quer uma alimentação mais sadia e parte para o consumo de frutas e verduras. Quase tudo contaminado, sem nenhum aviso aos consumidores. E acrescente-se ainda o que está embutido em alimentos enlatados, processados, aditivados. Não esqueçamos também outro produto cancerígeno, o amianto. Proibido em vários Estados do país, a gente, contudo, continua encontrando telhas e caixas d'água de amianto por toda parte. 
Enquanto isso, o governo e os parlamentares duelam pra saber quem roubou ou quem pedalou. O país é um paraíso para os alimentos geneticamente modificados, ainda não liberados por países que se prezam. Entre os campeões na produção  e venda de agrotóxicos está a multinacional Monsanto, que tem um lóbi imbatível. Tristes trópicos!, como diria Claude Lévi-Strauss.

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

FRANCISCO, O JESUÍTA (E FRANCISCANO) BISPO DE ROMA

Francisco, o bispo de Roma, como ele se apresentou em seu primeiro contato com o povo, na Praça de São Pedro, quando foi eleito papa, continua surpreendendo. Em sua visita pastoral a três países africanos onde há hostilidade entre muçulmanos e cristãos, ele pregou a conciliação entre religiões, e prosseguiu insistindo em sua proposta de uma ecologia global, que inclua toda a natureza, todos os animais, inclusive o homem. Uma ação ambientalista que seja também social. A África é um dos produtos mais acabados do colonialismo europeu. Depois de explorarem suas colônias até o bagaço e produzirem, mui cristãmente, alguns massacres, França, Grã-Bretanha, Portugal, Espanha, Bélgica, Alemanha, Itália resolveram fazer que largavam o osso, após a 2ª Guerra Mundial. Mas não sem antes traçarem as fronteiras daqueles povos juntando tribos inimigas e separando tribos amigas. Além de não haverem preparado uma elite capaz de governar decentemente os novos países.
Resultado na maioria dos países: massacres, genocídios, sobas substituindo os governantes coloniais. Quem descreveu os colonizadores do ex-Congo Belga, com fina gozação, foi o ditador Mobutu Sese Seko: "Ils sont curieux ces Belges, ils n'arrivent pas à surmonter leurs quérelles tribales" (São estranhos esses belgas. Eles não conseguem superar suas querelas tribais). Referia-se à velha rixa nesse pequeno país entre valões, que falam francês, e flamengos, que falam holandês. No segundo país que Francisco visitou, Uganda, que abriga mais de 500 mil refugiados de perseguições em outros países, o papa elogiou o extraordinário acolhimento a eles reservado. Disse ele: "Nosso mundo, em meio a tantas guerras, violência e diversas formas de injustiça, experimenta um movimento sem precedente de populações. O modo como tratamos essas pessoas é um teste de nossa humanidade, de nosso respeito pela dignidade humana e, sobretudo, de nossa solidariedade para com nossos irmãos e irmãs que que passam necessidade".
Ao visitar o Quênia, disse, em um bairro pobre de Nairóbi onde moram cerca de 100 mil pessoas: "Como não denunciar as injustiças que sofrem? A atroz injustiça da marginalização urbana. São as feridas provocadas por minorias que concentram o poder, a riqueza e esbanjam com egoísmo, enquanto crescentes maiorias devem refugiar-se em periferias abandonadas, contaminadas, descartadas". Como se pode notar, Francisco de Roma não perde ocasião de criticar o regime desumano que manda e desmanda no mundo, com poucas exceções. Ele evita falar de "capitalismo", mas o que ele diz expõe claramente o que ele pensa. Quão diferente de papas anteriores, que condenavam o socialismo, por mais tênue que fosse, como coisa do demônio. Xô, satanás! Pio 12 chegou ao cúmulo de proteger nazistas, após a derrota de Hitler, providenciando-lhes passaportes e enviando-os principalmente para a Argentina. Não é de admirar a notória ferocidade das ditaduras que assolaram os nossos vizinhos.
Não percam a minissérie "Francisco, o jesuíta", que vai ao ar no canal History, a partir da quinta-feira 3 de dezembro, sobre um papa tão diferenciado dos antecessores: o primeiro nascido no assim dito Novo Mundo, especificamente na América mais pobre, que é a Latina; um papa que chutou a classificação dinástica do papado, herança do Império Romano, intitulando-se apenas Francisco. Mesmo jesuíta, ele é um franciscano em espírito e ações. A produção da minissérie é baseada na biografia do papa escrita pelos jornalistas Sergio Rubin e Francesco Ambrogetti, "O papa Francisco - Conversas com Jorge Bergoglio ". A maior parte da produção é dedicada às atividades de Francisco no Vaticano, como sua luta para acabar com a corrupção no IOR (Banco do Vaticano), a ostentação da Cúria Romana, a pedofilia endêmica no clero, fruto certamente de um celibato não carismático, mas imposto à força pelo direito canônico. Fala também da tolerância para com divorciados e gays, esforços pela paz no Oriente Médio, entre Cuba e Estados Unidos.


TODO DIA É DIA DE ÍNDIO

Gente, mais uma vez, encrenca com a banda fio dental e provedor. Vou enviar-lhes hoje o post desta segunda-feira e o da sexta passada; e ficar postando em segunda ou terça, e sexta ou sábado, para tentar manter uma periodicidade. É costume dizer que o Brasil teve e continua tendo um comportamento, em relação aos primitivos habitantes de Pindorama, menos desumano que aquele praticado por estadunidenses e outros colonizadores das Américas, Isto só em parte é verdade. Muitos índios se salvaram porque abandonaram o litoral, mais rapidamente habitado pelo europeu, embrenhando-se na selva amazônica e mato-grossense. Houve também dificuldade em escravizar os índios, não só porque eles estavam em seu hábitat natural mas também por uma alegada proteção dos jesuítas. Mas a realidade é que, dos milhões de indígenas que tínhamos no início da colonização do nosso país, hoje só nos restam menos de um milhão.
Faço estas considerações a partir de notícias que se repetem constantemente sobre assassinatos de guaranis no Mato Grosso do Sul, por jagunços a mando de latifundiários e grileiros, e graves descuidos da Funai na própria Amazônia, que, apesar do desmatamento e da constante grilagem, ainda seria o último refúgio dos nossos silvícolas. A Funai é, por exemplo, acusada de omissão em grave conflito entre duas etnias, uma das quais ainda isolada, na Terra Indígena Vale do Javari, no noroeste do Estado do Amazonas (fronteira com o Peru); matis e corubos, estes isolados. As investigações ainda estão em curso, mas calculam-se os mortos entre 7 e 15. Consta que os matis, após alertarem a Funai e pedirem audiência em Brasília, revidaram ataque da etnia isolada há já um ano. Desde então, com total omissão da Funai, os contatos entre ambos os povos vêm sendo marcados pela violência. Além de tudo, os corubos estão com doenças respiratórias contagiosas e têm marcas de tiros no corpo.
Vê-se assim que a herança maldita das doenças da "civilização" branca já chegou ao Vale do Javari, que é a região com maior densidade de etnias isoladas do mundo. Essa região protegida é pressionada duramente por pescadores, caçadores, madeireiros e traficantes. Já são quase 20 anos que o sertanista Sidney Possuelo fez o primeiro contato com os corubos. Desde então os encontros com funcionários da Funai são ocasionais. A União dos Povos Indígenas do Javari, como vimos acima, há muito solicitou à Funai uma estratégia de pacificação. As queixas são muitas em relação à Funai. O coordenador-geral para índios isolados, Carlos Travassos, preferiu deslocar funcionários especializados para prestar assistência a sua amiga Mariana Mercadante, filha do ministro Mercadante, que faz filmagens por ali.
Sertanistas experientes acusam Travassos de irregularidades e má gestão e pediram sua saída do cargo. Possuelo afirma que a intenção é privatizar a área. O presidente da Funai, João Pedro da Costa, também está sendo acusado de omissão por sertanistas e amigos da causa indígena. Apesar disso tudo, os índios aculturados, mais abundantes no Nordeste e Sudeste do Brasil, vão cada vez mais se conscientizado de seus direitos e agindo para reaver o que perderam. É o que ocorre, por exemplo, com os xucurus de Pesqueira, sob a liderança do cacique Marquinhos, sucessor de seu pai, o cacique Chicão, assassinado a mando de latifundiários. Já conseguiram recuperar legalmente grande parte de suas terras tomadas por fazendeiros. Na vizinha Paraíba, os potiguaras da Bahia da Traição e adjacências também já lutam por seus direitos.


terça-feira, 24 de novembro de 2015

EDUCAÇÃO OU FAUSTÃO? JÁ PERDEMOS TEMPO DEMAIS

Caros leitores e leitoras, todos sabemos que os dados sobre educação no Brasil são lastimáveis, abaixo dos de países com economia e desenvolvimento menos sólidos, como Argentina, Chile, Uruguai. Trata-se de uma herança histórica ainda não superada. E ainda não superada exatamente pelo descuido com o ensino e a educação. Como disse, todos sabem disso, vendo todo dia os resultados dessa situação, entre as quais sobressai a falta de consciência cívica e política. Com “representantes do povo” como os que temos, que em geral representam apenas os que financiam suas campanhas políticas, não podemos ir muito longe. Não bastasse isso, a maioria dos meios de comunicação social, sem nenhuma regulação (ao contrário do que ocorre em países civilizados), anunciam quase diariamente aqueles vergonhosos dados. Não que sejam necessariamente contra o desastre do ensino brasileiro, que os favorece na desinformação generalizada que buscam. É que, com leitores, ouvintes, telespectadores educados e conscientes, não faturariam tanto com Faustões, novelas repetitivamente amorais, pregações supostamente religiosas, falsificações, omissões e “interpretações” de notícias em lugar da verdade factual.
Em se tratando de educação, temos aí mais uma do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin. Sua incompetência já ficou comprovada no caso do desastre hídrico que afeta o seu Estado, que não o impediu de ser reeleito. O que se deve às mistificações que inventou durante a campanha eleitoral, incluindo a não decretação do racionamento d’água em tempo de ao menos contornar em parte o grave problema.
Desde o início deste mês, muitas escolas estaduais paulistas foram ocupadas por seus alunos, que protestam contra uma decisão da Secretaria de Educação que prevê o fechamento de 92 unidades e o remanejamento de alunos de outras 754. Fundamento didático ou pedagógico? Não precisa. O negócio é fazer economia em tempo de vacas magras. Basicamente, argumentam que há melhor desempenho escolar nas unidades com somente um ciclo de ensino, fundamental 1, fundamental 2 ou médio. A própria Justiça hesita em decretar a reintegração de posse das escolas tomadas pelos alunos. Depois de autorizar uma reintegração em Diadema (ABC Paulista), recuou e vem buscando o caminho da conciliação entre as partes em litígio.
Já perdemos muito tempo com experimentos disparatados e sem base. E barrando iniciativas avançadas e pedagogicamente bem fundamentadas. No passado, tivemos o trabalho pioneiro do baiano Anísio Teixeira, que deu muitos frutos e está institucionalizado no Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos, que ele criou. Tivemos também o Sistema Paulo Freire de Educação, formulado por esse grande educador da UFPE nos anos 1960. O sistema, que incluía um revolucionário método de alfabetização de adultos, foi, junto com seu criador, exilado para a Europa, Estados Unidos, África, por não agradar aos “revolucionários” de 1964 porque educava conscientizando cívica e politicamente.

No início dos anos 1960, também em Pernambuco, Miguel Arraes criou o Movimento de Cultura Popular, voltado para a educação, alfabetização e valorização da cultura do povo. Fuzilado pelos golpistas de 1964. Darcy Ribeiro, junto com o já referido Anísio Teixeira, criou a Universidade de Brasília, concebida como uma das mais modernas do mundo. Foi torpedeada pelos golpistas. Leonel Brizola, quando governador do Rio Grande, encheu o Estado de escolas. Quando governador do Rio, criou os CIEPs, desmantelados pelos seus sucessores. Eram prédios bonitos, projetados por Oscar Niemeyer, onde as crianças passavam o dia, estudavam, brincavam, se alimentavam, adquiriam cidadania e cultura. Será que vamos continuar perdendo tempo ou alguma luz brilhará na mente de nossos governantes e congressistas?

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

SOBRE SÍNODO, VATILEAKS E REVOLUÇÃO FRANCISCANA

Um tema importante hoje, nestes dias tão conturbados, é que não há dúvida de que o papa Francisco está realizando uma autêntica revolução na Igreja e pelo mundo a fora. Uma revolução franciscana, apesar de ele ser jesuíta, o primeiro papa filiado a essa ordem religiosa. Sua tentativa de reconduzir o clero, especialmente os cardeais da obsoleta corte papal e bispos que teimam em viver como príncipes suntuosos, aos princípios e práticas evangélicos é reconhecida por todos. E admirada por quem sonha com o verdadeiro cristianismo, aquele que se nos apresenta no livro dos Atos dos Apóstolos e na vida de alguns santos que nem precisam de canonização.
No Sínodo por ele convocado e recentemente encerrado em Roma, ele conseguiu uma maioria curta, mas significativa, para implantar aquilo que julga ser uma Igreja mais mãe, mais misericordiosa, não inquisitorial. Se o papa fosse um Wojtyla, um Ratzinger, certamente, em circunstâncias similares, imporia tudo o que quisesse ex cathedra, sem consultar nem ouvir aqueles que, como ele, são os sucessores dos apóstolos. Antes dele, valiam muito pouco as conferências regionais de bispos, cujas conclusões só eram reconhecidas depois de passar pelo crivo das secretarias vaticanas, sendo podadas e adequadas aos ditames da Igreja-Império constantiniana. Até a instituição do Sínodo, ressuscitada pelo Concílio dos anos 1960, mas solenemente ignorada antes de Francisco, permaneceu sem uma legítima utilização. Aliás, essa história da infalibilidade papal merece considerações à parte numa outra postagem aos meus leitores e leitoras
Lá para o final do Sínodo, os descontentes, acostumados antes a ganhar em tudo, logo inventaram que o papa estava com um tumor no cérebro, o que, se verdadeiro, o impediria de exercer seu múnus pastoral. Quando viram que não eram levados a sério, partiram para a divulgação de segredos, num segundo VatiLeaks (o primeiro tinha sido a publicação de documentos secretos de Bento 16, o que está na origem da renúncia do atual papa emérito, algo que não se via há séculos). Duas pessoas que contavam com a confiança de Francisco, o bispo espanhol Lucio Angel Vallejo Balda e a leiga italiana (de origem franco-marroquina) Francesca Chaouqui, muito ligada ao clérigo, passaram documentos à imprensa.
O mal não está na divulgação de malfeitos do Vaticano, e sim na antecipação, para atrapalhar, de tantas coisas erradas que ocorrem, há tanto tempo, no IOR (mais conhecido do Banco do Vaticano) e na corte papal de um modo geral. Falando aos fiéis que vão todo domingo à Praça de São Pedro, disse Francisco: “Eu conhecia muito bem aqueles papéis porque eu mesmo requisitei certos estudos, com base nos quais começamos a fazer reformas que já estão dando seus frutos. [...] Esses acontecimentos deploráveis não ajudam, mas a reforma continua com o suporte dos meus colaboradores e de todos vocês”.
Quem mandou confiar no Opus Dei, instituição fascistoide muitíssimo apreciada por João Paulo 2º?
Um lado positivo desse vazamento é que o papa deu a entender claramente que que vai aproveitar a situação criada para acelerar as soluções de questões espinhosas, como a de residências luxuosas de certos cardeais. Francisco zangou-se, e com razão. Ninguém o segura mais, se Deus quiser. E Deus quer!

PS – Aguardem um pouco que eu estou continuando a revisão de “Viver é muito perigoso”. Tem muita coisa que a gente esquece. Eu tinha pressa, pois já estou nos oitenta.

segunda-feira, 16 de novembro de 2015

CRÔNICA DE MORTES PREVISÍVEIS, QUEM SABE ANUNCIADAS

O que ocorreu há poucos dias em Paris é uma desgraça, é tenebroso mesmo. Não foi a primeira vez. Infelizmente, não será a última. Esses atos de terrorismo vêm acontecendo com certa regularidade desde que radicais que dizem professar a fé muçulmana, embora se equivoquem quanto à mensagem de Maomé, cansaram das barbaridades cometidas, há muitos séculos, contra seus povos. Claro que não estou justificando o terrorismo, apenas tentando entender. E considerando tanto o terrorismo de povos oprimidos quanto o dos opressores. Sempre lembro que o governo estadunidense e os dos países ricos em geral fazem uma distinção capciosa e malandra entre terrorismo do bem (o praticado por eles) e terrorismo do mal, ditadura do bem e ditadura do mal.
Terrorismo da parte dos desenvolvidos? Certamente. Vejamos: bombardeio atômico de Hiroshima e Nagasaki, que nem sequer eram alvos militares; bombardeio de Dresden (Alemanha) com fósforo, que incendiou e torrou milhares de pessoas; destruição do multissecular mosteiro de Montecassino, perto de Nápoles; bombardeio com napalm no Vietnam; destruição do Iraque, hoje nas mãos do Estado Islâmico (o Museu da Mesopotâmia foi saqueado pelos “democratas” e hoje o país está em pior situação do que na época do indefensável Saddam Hussein); ajuda à implantação de ditaduras militares assassinas no Brasil, Chile e Argentina, nos anos 1960-1970; apoio constante ao genocídio do povo palestino praticado pelo governo israelense. Precisa mais? Isso não seria terrorismo?
Tudo começou com as Cruzadas, ensaio geral do colonialismo-imperialismo europeu que se firmaria a partir do século 16. O pretexto era livrar a Terra Santa do domínio muçulmano. O que interessava isso à religião? A não ser a um cristianismo cooptado pelo Império Romano e o que se lhe seguiu. Lembremos que os cristãos da Palestina, Síria, de todo o Oriente Médio, conviviam pacificamente com o islamismo. Como se vestiam como os demais habitantes da região, e não à moda europeia, muitos foram atacados e mortos pelos tão cristãos europeus cruzados. Quem já viu um legítimo cristão vestido à moda árabe ou turca?...
A partir do final do século 15, com os assim ditos “descobrimentos” (que expressão sacana!), os europeus foram se entretendo com as Américas, onde destruíram avançadas civilizações, como astecas, maias, incas, com a Índia e, mais tarde, com a África, toda retalhada e brutalmente explorada pelos tão civilizados franceses, ingleses, portugueses, alemães, espanhóis. A desgraça do Oriente Médio foi a descoberta do petróleo como o grande combustível de certo progresso confundido com civilização. Após o fim do Império Otomano, estadunidenses e europeus retalharam a seu bel prazer toda essa região, estabelecendo fronteiras artificiais, como a separação do Kwait, arrancado do Iraque, a separação entre o Líbano e a Síria e por aí vai. O Irã teve um primeiro-ministro chamado Mossadegh que ousou nacionalizar o petróleo. Pra que, gente? Golpe nele.
Já mais para o final do século passado, então, grupos radicalizados por tanta opressão e arbítrio passaram a se armar e a desenvolver uma ideologia de vingança contra a Europa e os Estados Unidos. O resultado está aí: mortes bem previsíveis, quiçá anunciadas (com a devida licença de Gabriel García Márquez).

PS – Como os temas são muitos e eu não estou mais escrevendo semanalmente no Jornal do Commercio, passarei a fazer duas postagens semanais, na segunda e na quinta-feira. Sempre que a fugidia banda estreita da nossa internet permitir.

segunda-feira, 9 de novembro de 2015

MAS QUE BELEZA! TENHO UM FUSCA E UM VIOLÃO

Sobre o tema tratado na semana passada de energias alternativas anuncia-se a implantação de placas fotovoltaicas flutuantes, pela Chesf (tão sacaneada pelo governo federal), no reservatório de Sobradinho (BA). Também serão instaladas placas assim no reservatório de Balbina (AM) pela Eletronorte. Experiência semelhante já existe num lago de Berkshire, na Inglaterra, que servirá de modelo para as hidrelétricas brasileiras.
Nosso assunto de hoje, porém, é (pasmem!) a Assembleia Legislativa de Pernambuco abrindo a possibilidade de mais desmatamento através de lei que abençoa a supressão de 88,33 hectares no Sertão do Araripe e mais uma lapada no Sertão do Pajeú, tudo atingindo Áreas de Preservação Permanente (APPs). No total já foi oficialmente liberada a destruição de 5.034 hectares apenas em nosso Estado. É incrível como órgãos federais e também estaduais trabalham contra a sociedade e a natureza cooperando para desmatamento e outras malfeitorias; como o Incra, que instala assentamentos em áreas de preservação e permite a assentados a exploração ilegal de madeira. Ou é conivente. Não dá para entender como um país que se pretende civilizado pode funcionar assim.
Só omissão ou conivência mesmo. Pois sabemos como a corrupção está solta neste país tropical. Embora digam que é “abençoado por Deus e bonito por natureza. Mas que beleza! Tenho um fusca e um violão...”. Para vigiar, por exemplo, a contínua e praticamente impune devastação da Floresta Amazônica o governo não poderia mobilizar a FAB e a Marinha de Guerra? É aproveitar já que os militares estão numa certa, digamos, ociosidade já que oficialmente temos paz (apesar da guerra civil do tráfico e de outras explosões de violência) e não há nenhum golpe militar em perspectiva. T’esconjuro! Além disso, temos o Sivam (Sistema de Vigilância da Amazônia), que ninguém sabe como, ou se, funciona a bem do Brasil, pois o eminente xogum Fernando 2º entregou sua operação, de mão beijada, aos Estados Unidos, atendendo a solicitação do seu amigo Bill Clinton, que arranja pra ele conferências bem remuneradas para plateias que gostam de ouvir mesmices.
As fronteiras estão mal guarnecidas, pois, com a crise braba, também o orçamento das forças armadas foi podado barbaramente. Resultado: o contrabando de tudo, inclusive armas, pelos rios das bacias Amazônica e do Paraná-Uruguai, é extremamente facilitado. E a bandidagem fica bem armada; agora principalmente com a extinção praticamente certa do Estatuto do Desarmamento, obra da bancada BBB (boi, bala e Bíblia).
E assim voltamos ao começo. Como pessoas que se dizem nossos representantes podem nos representar tão pouco, prestando seus serviços aos financiadores de suas campanhas? Como é que dona Dilma pode entregar o Ministério da Agricultura à bancada do boi? Como, em um país oficialmente laico, pode haver uma bancada da Bíblia, e bem poderosa. Igreja é uma coisa, partido político é outra.

PS – Lembrando: no próximo domingo, dia 15, às 10h, evento, na igrejinha das Fronteiras, em comemoração dos 50 anos do Pacto das Catacumbas, que, no final do Concílio dos anos 1960, teve a articulação de Dom Helder. O historiador e teólogo Eduardo Hoornaert fará uma reflexão e será lançado o livro O Pacto – Ideário de uma Igreja pobre e servidora.

terça-feira, 3 de novembro de 2015

ENERGIA EÓLICA, UM SALTO DE FONTE LIMPA PARA O FUTURO

Primeiro que tudo, me desculpem o atraso nesta postagem. É que a nossa internet desapareceu por um bom tempo ontem. Registro aqui o desenvolvimento do parque de energia eólica em nosso Estado, que se concentra no Sertão e foi divulgado em reportagem da coleguinha Angela Fernanda Belfort, do Jornal do Commercio. Uma empresa cearense, a Casa dos Ventos, está inaugurando um grande parque em Caetés, Ventos de Santa Brígida, que tem capacidade para gerar 181,9 magawatts. E outra empresa, a italiana Enel Green Power, inaugurou outro em Tacaratu, Fontes dos Ventos (80 MW). Ambas investiram R$1,5 bilhão. Já temos capacidade para gerar quase 50% da eletricidade consumida no Nordeste.
Mais R$1,8 bilhão serão investidos em mais três parques eólicos até 2017. Antes, a prioridade para a instalação de energia eólica estava no Rio Grande do Norte, Ceará e Bahia. Em nosso Estado e no Piauí, as prospecções e implantações começaram mais recentemente, quando as torres eólicas adquiriram mais altura (150 metros), o que permite maior captação.
Dado o surto de exploração dessa fonte energética, uma indústria de componentes eólicos já se instalou em Suape. E tem agricultores em dificuldades devido à seca que estão ganhando algum dinheiro com o aluguel de terras para a construção das torres; enquanto donos de pequenos negócios de restaurante e pousada viram seus empreendimentos se multiplicarem. O Nordeste pode gerar 100% de eólica poupando água das hidrelétricas nestes tempos de barragens em processo de quase total secagem. É a opinião do professor Everaldo Feitosa, que é vice-presidente da Associação Mundial de Energia Eólica e foi um dos primeiros a defender o potencial da nossa região quanto a essa fonte energética.
PS – 1 - Está completando um ano de circulação a revista Viver Aldeia (viver.aldeia@gmail.com), publicação dirigida aos moradores da APA Aldeia-Beberibe e àqueles que possuem ali casas e sítios onde passam fins de semana e férias.
2 – O Instituto Dom Helder Câmara (IDHeC) está convidando para a celebração do jubileu de ouro de um importantíssimo documento da história mais recente da Igreja, o Pacto das Catacumbas, compromisso tomado por um grupo de bispos, incluindo Dom Helder, participantes do Concílio Ecumênico Vaticano 2º. Será no dia 15 de novembro às 10h na igreja das Fronteiras e contará com uma reflexão do historiador Eduardo Hoornaert e o lançamento do livro O Pacto: ideário de uma Igreja pobre e servidora.

3 – Circulando mais um número do Jornal Igreja Nova.

terça-feira, 27 de outubro de 2015

OS JUDEUS E O RECIFE, UMA HISTÓRIA DE AMOR ANTIGA

“A violência aumentou demais em Israel. Por isso esses atos começaram a ser programados pelo mundo. Foi pura coincidência ter sido no mesmo dia do Festival da Cultura Judaica, o que terminou sendo bom porque reuniu mais pessoas. Estamos aqui para repudiar os atentados terroristas que estão acontecendo em Israel”. Assim se expressou Haim Ferreira, um dos organizadores do ato pela paz em Israel realizado domingo no Recife.
O Festival da Cultura Judaica realizou-se pela 24ª vez na Rua do Bom Jesus (antiga Rua dos Judeus) em torno da primeira sinagoga das Américas, a Kahal Zur Israel. Tem toda a razão de ser, pois o nosso Estado, sobretudo o Recife e adjacências (que já foi o Brasil Holandês), nasceu e cresceu com os cristãos novos, judeus forçados a “se converter” ao cristianismo para escapar às fogueiras da Inquisição. Vale conferir o livro do médico e escritor Candido Pinheiro, a sair em novembro, sob o título Branca Dias, filhos, netos e a Inquisição, sobre essa ainda hoje lembrada senhora de engenho que não conseguiu escapar do braço armado de uma Igreja transviada do Evangelho. No Açude da Prata, por trás do Horto de Dois Irmãos, consta, por antiga lenda, que ela jogou sua prataria, acreditando que voltaria viva ao Brasil. Na história de amor entre o Recife e os judeus também houve, infelizmente, episódios de desamor como esse.
O festival está agora integrado ao Recife Antigo de Coração e compõe-se de música, dança, exposição fotográfica e barracas para venda de comedorias específicas da colônia judaica pernambucana. Tudo aberto ao público. Só a visita à sinagoga custava, ontem, o preço promocional de R$5. Atração à parte foi a Orquestra Judaica do Recife. Valeu a pena também a exposição fotográfica Memorabília, de Cláudia Jacobovitz, que teve quase toda a família de sua avó Nora dizimada pelo nazismo na Polônia.
Lembremos que houve duas ondas de imigração de judeus para o Recife, sem contar os cristãos novos. A primeira durante o infelizmente efêmero governo de Maurício de Nassau, no século 17, quando conviviam pacificamente calvinistas holandeses, católicos portugueses e judeus. Uma espécie de reedição do Reino de Córdoba, último reduto dos muçulmanos na Espanha, com seus grandes sábios, como Avicena e Avarroes, e aquela arte moura que sobrevive até hoje. A segunda onda migratória judaica só veio dar-se no início do século passado. Com a saída dos holandeses, o que judeus e protestantes podiam aguardar era a volta da Inquisição. E ainda chamam a isso de “Restauração Pernambucana”.
Para terminar, volto à informação que inicia esta postagem. Está escondida ali a confusão habitual que se faz entre os judeus por etnia espalhados pelo mundo e o Estado de Israel; bem como a defesa geral da belicosidade do Estado sionista, por parte de muitos. O sr. Haim Ferreira omite, ou esquece, os atentados terroristas cometidos pelo governo israelense contra os palestinos, desde a expulsão de milhares deles de suas casas e terras em 1948 até a atual colonização daquilo que resta do que deveria ser, segundo a ONU, o Estado Palestino, que englobaria também a Faixa de Gaza. Como o povo palestino, que habita aquelas terras há séculos, não tem nenhuma culpa pelo que os nazistas, e antes deles muitos outros, fizeram contra o povo judeu, fica difícil entender a posição do governo israelense. Ou não seria terrorismo cercar as aldeias palestinas de muros (não é só o Muro de Berlim que deve ser visto como antidemocrático e desumano), impedir o livre acesso de palestinos aonde quiserem, sobretudo à esplanada onde têm sua venerável mesquita, destruir quase totalmente a Faixa de Gaza e impedir que entrem ali materiais de construção, dificultar ajuda humanitária a um quarto da população palestina que vive na pobreza?
Como o governo dos Estados Unidos, o governo israelense divide o terrorismo entre terrorismo do mal (o praticado por outros) e terrorismo do bem (o praticado por eles.
PS – 1- Foi-se há alguns dias o brilhante Ustra, um torturador torturado pelo câncer. Uma lei que só poderia existir no Brasil protege todos aqueles que torturaram, mataram, “desapareceram” e aqueles que justificaram tudo isso, generais-ditadores e patentes de menor calibre.

            2- Amanhã, terça, haverá sessão solene às 9h, na Câmara Municipal do Recife, em homenagem ao Padre Henrique, trucidado pela ditadura; por iniciativa da vereadora Isabella de Roldão.

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

DAS GUERRAS DO ÓPIO A UM COLONIALISMO MAIS MODERNO. MENOS PREDATÓRIO?

Segundo avaliação da entidade Global Financial Integrity, cerca de US$170 bilhões de empresas saíram ilegalmente do Brasil nos últimos dez anos. A principal razão para isso é o tratamento preferencial dado ao capital estrangeiro, subtaxado quando da remessa de lucros para o exterior, conforme a organização Tax Justice Network. Essas informações provêm da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que pretende promover uma reforma do padrão tributário internacional para obrigar as empresas transnacionais a declarar os lucros nos países onde vendem e faturam. As perdas de países como o nosso por sonegação são estimadas em 10% da receita tributável, a maior parte desviada para países com taxação baixa e paraísos fiscais.

O fato é que nenhum país hoje desenvolvido passou por processos criados mais recentemente, sob a égide da Organização Internacional do Comércio (OIC), como, por exemplo, a proibição de governos protegerem as empresas de seus países e tomarem medidas contra o imperialismo comercial. “Nenhum país hoje desenvolvido praticou o livre comércio”, afirma o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, representante geral do Mercosul em discussões com a União Europeia. Países como a Grã-Bretanha (GB), os Estados Unidos (EUA) e outros do assim dito Primeiro Mundo primeiro se desenvolveram com um comércio sem peias, para, mais tarde, arquitetarem regras inibidoras para quem não tinha tradição industrial e comercial. A Grã-Bretanha também recorreu (e como!) à pirataria pura e simples, disfarçando seus piratas sob a designação de corsários. Ora pois, diriam os lusos. E engendrou duas Guerras do Ópio (aí não disfarçaram) para obrigar a China a produzir e consumir a droga. A atual guerra às drogas foi inventada muito depois e é responsável pelos males que vemos por aí: tráfico, bairros inteiros dominados por traficantes coadjuvados por certos bandidos fardados. Após as Guerras do Ópio, a tão cristã e civilizada Inglaterra ainda se julgou com o direito de passar um século dominando a colônia de Hong-Kong. E viva o capitalismo, tão ético e democrático.

Depois de tudo isso, no alvorecer do século 21, os países ricos de sempre pretendem expandir o neocolonialismo ao proporem a criação de um Tratado Transpacífico que juntará num mercado comum, além de países superdesenvolvidos, como EUA, Canadá e Japão, também México (com sua economia já desmantela por tratado similar com EUA e Canadá), Chile, Peru, Austrália, Nova Zelândia, Malásia, Cingapura, Vietnam e Brunei. O mais espantoso é que tal acordo foi decidido por cima dos respectivos governos, pelas transnacionais, Wall Street e advogados. Uma renúncia sem precedentes ao poder dos Estados nacionais em favor de empresas privadas.

O mais estranho é que, vendo o diabo ou o rabo dele em tudo que o governo de Brasília faz ou deixa de fazer, tem muita gente aí reclamando a ausência do nosso país no Transpacífico. Pindorama, aliás, não é banhada por nem uma gota d’água do oceano Pacífico. Este governo que está aí merece muita crítica, mas não vamos exagerar.

segunda-feira, 12 de outubro de 2015

GUARANIS CAÇADOS POR JAGUNÇOS NO MATO GROSSO DO SUL.



Os indígenas de Pindorama tiveram um pouco mais de sorte que os dos Estados Unidos pelo fato de os portugueses não terem empreendido uma corrida para o Far West, não só porque os espanhóis vinham comendo aquelas beiradas sul-americanas do oeste, mas por terem preferido explorar logo o nosso vasto litoral e a região da Mata Atlântica. Os índios que não foram mortos foram adentrando o Centro-Oeste e a Amazônia onde, a partir dos governos militares, vêm sendo surpreendidos por madeireiros, plantadores de soja, grileiros de toda espécie. O fato é que ainda temos muita coisa a salvar da floresta e dos povos da floresta, enquanto os americanos dizimaram povos inteiros e transformaram o que sobrou em uma espécie de animais de reservas.
Faço estas considerações ao ver o que estão fazendo contra os guaranis no Mato Grosso do Sul. Esses índios reivindicam a pose da terra indígena Nhande ru Marangatu, uma áreas de 9,3 mil hectares homologada pelo governo Lula em 2005. Fazendeiros e grileiros ganharam reintegração de posse do excelso ministro do STF Nelson Jobim, aquele que gostava de se fantasiar de soldadinho quando ministro da Defesa. Desde então a questão está sub iudice. Já que nada se resolveu em dez anos, 1.400 índios resolveram ocupar o terreno já homologado. A reação dos ruralistas, que integram o segundo governo de dona Dilma, não demorou. Decidiram retomar as fazendas recuperadas pelos índios e vêm matando muitos deles (só no ano passado 41 foram assassinados). “Agora, o único jeito de nos tirar daqui é se matarem todos nós”, diz o índio Mariano Vilhalva, sobrinho do assassinado guarani-kaiowá Simão Vilhalva. Pistoleiros e jagunços dos fazendeiros andam à solta e só são um pouco contidos por forças da União e do Estado.
O grande equívoco do governo federal, nessa questão, é negociar direitos que são inegociáveis, segundo o repórter Rodrigo Martins (Carta Capital). O procurador da República em Dourados (MS) Marco Antônio Delfino ajuizou, este ano, uma ação  contra o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, por improbidade administrativa. A ex-presidente da Funai Maria Augusta Assirati, depois que se desligou da entidade, denunciou à imprensa que os grupos de trabalho para identificar terras indígenas não puderam concluir seus relatórios por determinação expressa do Ministério da Justiça. Por sua ação em prol dos índios, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi, ligado à CNBB) está na alça de mira dos fazendeiros. Os ruralistas, protegidos pelo presidente do Senado, Renan Calheiros, querem transferir para o Legislativo a atribuição de homologar terras indígenas, além de permitir atividades agropecuárias e de garimpo nessas terras. Com esse Congresso maravilhoso que temos aí, o que se pode esperar quando conseguirem isso?

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

TEM ALGUÉM QUEIMANDO COISA. TÁ BOTANDO PRA QUEBRAR. OU ENTÃO É A ZEFINHA PREPARANDO MEU JANTAR



Oi, gente! Pelo jeito, não se respeita mais horário marcado neste país. Aliás, não se respeita nada. Com o Congresso de mal com o Executivo e o Supremo fazendo o papel de Legislativo, o resto do país vai atrás no faz-de-conta. Serviços cobrados caro não são prestados a contento, por exemplo. E, apesar do zelo da Polícia Federal e de alguns procuradores e juízes, as poucas verbas que restaram na crise são ainda mais insuficientes pelo fato de prosseguirem as propinas e a fome de privatização do dinheiro público.
Comecei a escrever esta postagem pensando no que ocorreu duas vezes com minha filha Hélida (de Patrícia, mas é mesmo que ser minha, pois convivo com ela desde que tinha dez anos; tenho tempo de serviço; quanto mais pai, mãe, avô, avó melhor). Duas vezes ela levou meu netinho Benito pra ver Palavra Cantada, um espetáculo de cantigas infantis. Cansou de esperar. A primeira vez foi no Parque da Jaqueira. Após horas de espera, foi embora. Não sabe nem se houve o que estava prometido. Agora o caso se repete no Shopping Recife. Atraso de pelo menos duas horas; mas afinal apareceram algumas palavras cantadas. Ora, todo mundo merece respeito. Criança, mais ainda.
Outra má experiência. Assino a revista Carta Capital há uns 15 anos, cansado da Veja e outras baboseiras perigosas, pois pretendem refletir a opinião pública. Toda vez que é para renovar é um drama. Não avisam nada e ainda inventam débitos de um ano atrás. Há algumas semanas que não a recebo. Outro enguiço com a assinatura do Jornal do Commercio. Mandei pro crédito automático no Banco do Brasil, mas o banco só paga se houver uma confirmação a cada parcela. Além do mais, a minha agência mudou-se da Reitoria da UFPE para o Parque do Cordeiro e não levou os telefones. Sem nenhum aviso. Pode, gente? Será que tem alguma societas sceleris (sociedade criminosa ou crime organizado) querendo afundar o Banco do Brasil, como aconteceu com a Petrobras?
“Ou então é a Zefinha preparando meu jantar”, como na cantiga do fumacê. Ou pior: “Tem alguém queimando coisa. Tá botando pra quebrar”. É a Zefinha? É a coisa? A erva? O desgoverno? Quem votou na Dilma foi para ter uma ministra ruralista, um ministro dos banqueiros? Um ministério dito “renovado”, mas carimbado pela mesmice? E ainda temos de torcer para que não haja clima para um golpe, como querem Fernando 2º, Serrinha, Aecito et caterva. Democracia, eleições, alternância no poder, essa turma não sabe o que é isso. São discípulos tardios do corvo Carlos Lacerda, que levou Vargas (eleito democraticamente) ao desespero, quis impedir a candidatura e depois a posse de JK e terminou sendo descartado pelos militares que tanto bajulara.