Prosseguindo com o tema da última postagem. Depois que o general-ditador
Ernesto Geisel atropelou, mais uma vez, a Cidade Maravilhosa fundindo o Estado
da Guanabara, criado depois que o Distrito Federal migrou para o Planalto
Central, com o velho Estado do Rio, cuja capital sempre foi em Niterói, uma
horda de corruptos e incompetentes tomou de assalto a velha e nobre cidade de
São Sebastião do Rio de Janeiro (que, apesar de tudo, "continua linda”,
como cantaram Gil e Caetano antes de partirem para o exílio). Segundo um artigo
do jornalista José Roberto Guzzo, de outubro de 2009, "o Rio de Janeiro se
viu castigado por alguns dos piores governos já registrados na história
humana".
Essa fusão arbitrariamente imposta lembra um processo inverso que
aconteceu com a província de Pernambuco, quando perdemos Alagoas, que se tornou
província autônoma, e a Comarca do São Francisco, que abrangia a margem
esquerda desse rio. Mas ali não se constituiu uma nova província. Foi empurrada
para Minas e depois para a Bahia. O Geisel daquele tempo, que se chamava Pedro
1º, não gostava de Pernambuco, que vivia fazendo revoluções contra o poder
central, querendo república, federação, liberdade. É o único Estado que perdeu
grande parte do seu território, não para criar um novo, como aconteceu com
Goiás, Pará, Amazonas, mas para ser anexada a outro. E ficou por isso mesmo.
Não se questionou mais o arbítrio. A não ser, quixotescamente, Barbosa Lima
Sobrinho, em plena ditadura.
Não sei por que não se questiona agora, depois que voltou uma certa dose
de democracia, essa fusão, que só interessava à ditadura e ao ditador do
momento. A Cidade Maravilhosa só tem a perder com a continuação desse casamento
suspeitoso, como diria Ariano Suassuna. A Justiça perdeu, como me contou um
juiz aposentado da Guanabara, com a insegurança jurídica herdada de um Estado que
não progredira (o Estado do Rio), com grande quantidade de magistrados
viciados. A representação popular piorou de qualidade. No Executivo, em lugar
de governadores qualificados como Carlos Lacerda, Negrão de Lima, Chagas
Freitas, os fluminenses que vieram depois chafurdaram bastante na incompetência
e também no desregramento.
Referi-me a Lacerda. Ele era golpista empedernido, mas um cara culto. E,
na gestão dele, o Rio ganhou obras monumentais, como o Parque do Flamengo, o
túnel que vai do Rio Comprido à Lagoa e o outro, menor, Catumbi-Laranjeiras. É
verdade que recebeu muita ajuda da Aliança para o Progresso (Usaid), através da
qual o governo dos Estados Unidos favorecia os governadores anti-Jango. Por
outro lado, desmontou muitas favelas da Zona Sul, empurrando os pobres que ali
moravam para subúrbios longínquos e com transporte precário.
Se eu ainda morasse no Rio, faria uma campanha constante para o divórcio
dessa união viciada. Daria uma de Cícero, terminando todos os meus artigos na
imprensa etc. com um "Ceterum censeo Carthaginem esse delendam",
("De mais a mais, acho que Cartago deve ser destruída"): Acho que o
Estado da Guanabara deve ser restaurado. Dos meus colegas daquela época muitos
já morreram. E a turma mais jovem talvez nem se lembre que sua cidade já foi um
Estado. Isso me lembra Pelópidas da Silveira, um grande prefeito que o Recife
teve. Ele falava que uma das coisas ruins de se ficar velho é que, quando a
gente quer ver um amigo precisa ir ao cemitério.
Gente, revisei os três primeiros capítulos de "Viver é muito
perigoso e acrescentei algumas coisas. Convido-os a conferir.
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