segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

ESPECULAÇÃO X REPORTAGEM, NOTÍCIA



É quase Carnaval (evoé, Baco) e não vou ocupar muito vocês com minhas elucubrações, tantas vezes “mordazes”, como dizia meu desaparecido amigo Moysés Kertsman. Por outro lado, tentarei iniciar a divulgação de minha autobiografia (tão precoce...), antes que alguém resolva escrever sobre mim (pretensão, pois não sou nenhuma personalidade) sem autorização e eu tenha de pedir socorro a Roberto Carlos, que tem know how em censura.
Desejo só fazer ligeiro comentário a respeito de coluna de Paul Krugman no The New York Times sobre “reportagens que passam direto pelas verdadeiras questões políticas para especular sobre como elas influirão politicamente”. É o tipo de reportagem e outros programas jornalísticos da Rede Globo (as outras redes são menos drásticas em suas “interpretações” dos faros) e, com muito menos competência, da Veja. Por obrigação profissional, sou obrigado a ver muita coisa que normalmente não veria. Mas você pode passar pelos programas e comentários político-econômicos de William Waack, Bonner, Alexandre Garcia, Miriam Leitão (esta foi, talvez ainda seja, esquerdista, foi perseguida pelo golpe e andou se escondendo no Espírito Santo; sempre que pode faz reportagens sobre os malfeitos dos anos de chumbo; o que não é de admirar, pois a própria Globo incrivelmente afirma que está arrependida por haver apoiado o golpe que a elevou aos píncaros), entre outros. E só encontrará especulações e sempre os mesmos convidados: economistas servidores de bancos, ex-ministros de Fernando 2º (FHC), políticos e jornalistas da direita para a extrema direita, quando não golpistas.
O que deveria ser comentários em cima dos fatos passa rapidamente a especulações sobre, por exemplo, os bárbaros erros da presidente Dilma (tudo está sempre errado); a baixa apreciação da economia do país pelos organismos internacionais, todos obedientes aos Estados Unidos; as graves e autorizadas declarações de Aécio Neves, Eduardo Campos e outros oposicionistas sem programa. Etc. etc. etc. Diz Krugman: “Não apenas a reportagem de segunda ordem nega a informação que a audiência deveria receber. A verdade é que ninguém sabe como qualquer item do noticiário em particular influirá politicamente”.
Eu acrescento: a não ser alguns, muitos, autointitulados cientistas políticos ou comentaristas do tipo “global”. Ademais, Globo, Veja et caterva confundem regulação da mídia (que existe em qualquer país civilizado) com censura.

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

DE PARANAMBUCA E BLOCO DA SAUDADE


O estádio que Pernambuco ganhou para a Copa das Confederações e a do Mundo continua pagão, não foi batizado. A não ser que se considere o batismo com cerveja da Itaipava. Em artigo no Jornal do Commercio, sugeri que, para fugir à mesmice de Mineirão, Itaquerão, o estádio (a Fifa só aceita arena e nós, como sempre, baixamos a cabeça, ou melhor, quem manda em nós) construído a duras penas em São Lourenço da Mata ganhasse o nome primitivo de Pernambuco, derivado das palavras indígenas paraná (mar) e puca (ruptura): ruptura do mar ou mar que irrompe terra a dentro. Quando fiz esta sugestão, recebi de Roberto Harrop, meu vizinho aqui nas restantes matas de Aldeia, uma mensagem. Além de fotógrafo assíduo dos passarinhos e outros animais do nosso condomínio, ele é muito entendido em pesquisa de mercado, línguas tupi-guaranis e cultura judaica Explicou-me que, conforme a gramática indígena, a junção daquelas duas palavras faz com que paraná ganhe um eme no final e puca troque o pê por bê, ficando o resultado final como paranambuca, que virou Pernambuco. Já pensaram Arena Paranambuca, uma designação que faria jus à originalidade e pioneirismo que são características do nosso Estado.

Estamos em plena época carnavalesca. Antigamente, o Carnaval ia do Sábado de Zé Pereira à terça-feira seguinte (com exceção do famoso baile intitulado “O Carnaval Começa no Cabanga”, na sexta pré-Zé Pereira), tudo parando na madrugada da Quarta-Feira de Cinzas. Um militar americano desavisado que servia no Recife não entendeu nada quando ligou o rádio na manhã das Cinzas e estava tocando música clássica ou religiosa. Aí ele perguntou: -Por que não mais Cecília? Cecília era uma marchinha de um daqueles anos do final da 2ª Guerra Mundial. Hoje é Carnaval o ano inteiro e Quarta de Cinzas não é mais a “quarta-feira ingrata”. Não se trata de saudosismo, mas a repetição abusiva tira um pouco a graça da coisa. No Recife, o Carnaval traz um imenso transtorno mesmo à população que gosta dele. Espaços ocupados sem necessidade, linhas de ônibus que mudam de terminal e de itinerário, água suja jogada em cima das pessoas, e o incontornável galo plantado na Ponte Duarte Coelho ou no Capibaribe, que não tem nada com as nossas tradições carnavalescas.

Pessoalmente, nunca fui de curtir multidões, apesar de não sofrer de agorafobia, mas sempre gostei de acompanhar os chamados blocos líricos. Quando ainda podia pular uma noite inteira, adorava os acertos do Bloco da Saudade na AABB, depois no Náutico; todo mundo alegre e feliz, não tinha uma briga, e havia também muitos adolescentes levados pelos pais, que curtiam à beça (“E o Bloco da Saudade assim recorda tudo o que passou”). Lá encontrava gente como Capiba. E até, uma vez, o inesquecível cônsul da França em Pernambuco em tempos idos, Marcel Morin, já velhinho. Ele se integrou tanto ao Recife que era tratado por Marcelo Amorim. Era sócio e frequentador assíduo do Madeiras do Rosarinho. Tinha muitos amigos esquerdistas e ajudou um bocado de gente com bolsas de estudo em seu país, para fugir da redentora (como Stanislaw Ponte Preta chamava o golpe de 1964) e escapar do Festival da Besteira que Assola o País, retratado em livro desse grande humorista. Um dos personagens do livro é um tal de general Façanha, que tinha feito lá uma besteira qualquer e ganhou de Sérgio Porto (o nome real de Ponte Preta) uma crônica sob o título “A façanha do general idem”.

Desejo a todos um excelente e inesquecível Carnaval ou um bom esconderijo pra curtir outras coisas, como jazz em Garanhuns, por exemplo.

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

PITADA DE SOCIALISMO DESCAFEINADO


Pois é, gente amiga, mais de cem pessoas estão seguindo este blogue e interagindo comigo. Obrigado. Esqueci de falar uma coisa. No meu último artigo no Jornal do Commercio (1º de fevereiro), expliquei o “nego veio”, mas não na postagem de uma semana atrás. É que eu tenho muita dificuldade em gravar o nome e fisionomia de pessoas que vejo pouco. Daí desenvolvi o macete de tratar todo mundo por “nego veio” e o tratamento virou pra cima de mim. No jornal, sou conhecido como Nego Veio pelos colegas e Pai Jura pelas meninas.

Bem, falava eu sobre o monumental atraso do nosso país, que não faz sentido. A colonização dos atuais Estados Unidos começou no século 17 quando o Recife, por exemplo, era uma das cidades mais progressistas do mundo (Nova York nem existia), tendo mandado de volta para Portugal a Santa Inquisição e estabelecido um convívio pacífico e civilizado entre lusos católicos, judeus e holandeses calvinistas. O retorno da colonização portuguesa, que alguns historiadores chamam pomposamente de Restauração (tem até um hospital com esse nome), trouxe de volta o atraso e a discriminação. Restauração do que? Da Inquisição?

Hoje estamos aqui com uma eleição pela frente, cujo grande campo de batalha é o prosseguimento de alguns avanços sociais e de uma política externa mais independente, de um lado, e a restauração do alinhamento automático a Washington e da manutenção dos miseráveis em seu lugar, do outro. Como a oposição não pode mostrar claramente seu programa antipovo, suas grandes questões são um jantar da presidente Dilma em Lisboa, a deserção de mais uma cubana que quer encontrar o namorado em Miami ou até “a crise” que aparentemente só atinge o Brasil por culpa de governos esquerdistas. Calma, gente, estamos muito longe de socialismo e comunismo. A não ser que se considere socialismo o social-coronelismo do PSB, a social-democracia de Fernando 2º, Serrinha etc. ou o “comunismo” do PCdoB.

Queria (continuo querendo) ainda continuar aquela conversa do meu artigo de 1º de fevereiro no JC sobre notícias que aparecem todo dia e deixam a gente a duvidar da sanidade de nossa sociedade. Falava eu daquela história que corre de que o prefeito de Olinda dá expediente na Padaria Globo ali no Varadouro. Claro que é piada, mas combina com charge recente do JC com o prefeito Renildo deitado numa rede na Praia do Francês (na terra dele) e dizendo “É, eu ouvi falar que o Carnaval de Olinda é muito bom”. Consta ainda que o clã alagoano dos Calheiros, diante do pouco espaço político no Estado, teria se reunido e decidido enviar Renildo para Pernambuco e para o PCdoB. Uma pitada de socialismo descafeinado (aquele que não faz mal ao capitalismo) poderia ajuda-lo. Que minha amiga Luciana Santos me perdoe. As administrações dela foram boas, apesar da falta de verba na PMO, embora com obras pouco visíveis na área rural, como dragagem de canais. A estupidez politiqueira fatiou Olinda de tal modo que sobrou muito pouco e a inviabilizou financeiramente. Mas também ficar colecionando obras intermináveis e inacabadas não é digno de uma cidade que “não se apalpa, é só desejo” e de onde se enxerga “muito além do além das ondas”, como poetava Carlos Pena.

Numa última, por enquanto, observação, quero expressar minha estranheza diante da aberta propaganda pró-Eduardo Campos do nosso arcebispo dom Fernando Saburido. Ao elogiar o Pacto pela Vida, disse que “se Deus quiser, vai se ampliar para o Brasil todo”. Estranhei porque dom Fernando é um religioso verdadeiro, que sabe muito bem que não se deve misturar política com religião e que o catolicismo, há muito tempo, ao menos no papel, não é mais a religião oficial do Estado, como no tempo do Império. Estranho também que o meu amigo padre Edvaldo Gomes tenha exaltado em missa o governador Eduardo e o prefeito Geraldo Júlio. É evidente que, pessoalmente e não no púlpito, devem fazer suas opções. Felizmente, o Hermano Francisco não faz propaganda política para ninguém.

domingo, 2 de fevereiro de 2014

LIBERDADE DE EXPRESSÃO



Quando completei 80 anos, estava maturando a ideia de criar este blogue. Meu objetivo era, e continua sendo, me comunicar com meus filhos, noras, netos, netas, amigos, amigas e demais pessoas que me leem e me dão feedback, além de poder dizer o que eu quiser naquela real e plena liberdade de expressão com que a internet nos premiou. Mas não coloquei logo a ideia em prática. Agora que estou me aproximando dos 82, tomo ânimo para enfrentar este novo e promissor meio de comunicação, depois de passar ligeiramente por rádio e TV, e longamente por jornal
Além das atualizações periódicas, irei aos poucos abrindo acesso a uma história de minha já longa vida (tenho muita coisa pra contar e, como o poeta Gonçalves Dias, asseguro: “Meninos, eu vi”) e a uma seleção dos trabalhos que fui fazendo estes anos todos em diversos jornais, principalmente no Jornal do Commercio.
Neste momento, o meu pensamento se volta para uma triste realidade. Estão completando 57 anos que eu terminei meus estudos na Europa e voltei para o Brasil. Morei lá de 1952 a 1957 fazendo bacharelado e licenciatura em teologia (na época, eu estudava para ser padre, mas descobri em tempo que essa não era minha vocação). Quando cheguei a Roma em outubro de 1952, a 2º Guerra Mundial terminara havia apenas sete anos. Na Itália e, depois, viajando pela Europa, descobri admirado que tudo funcionava perfeitamente, como se o continente não tivesse enfrentado o terror da invasão nazista nem a destruição provocada pela retomada. Transportes e outros serviços públicos, estradas de ferro, rodovias, tudo perfeito e dentro dos horários estabelecidos.
É verdade que os Estados Unidos investiram muito a fundo perdido na reconstrução da Europa, através do Plano Marshall. Mas esse investimento escorreria pelo ralo da incompetência e da corrupção (como ocorre até hoje por aqui) se a Europa não tivesse a quilometragem de civilização e exercício da cidadania que tem. O medo do comunismo agiu como alavanca da Sociedade de Bem-Estar (Welfare Society) que garantiu aos europeus da banda ocidental décadas de boa atenção à saúde, à educação, à habitação, até o colapso da União Soviética e o surgimento de Margaret Thatcher e seus discípulos com um liberalismo démodé que descambou para a crise atual e para a entronização dos bancos como santo dos santos de um capitalismo financeiro que oprime gente comum, nós, e salva banqueiros (o hermano Francisco não me deixa mentir).
Quase 60 anos após meu retorno a Pindorama, nossas estradas de ferro foram, quase todas, criminosamente extintas; as rodovias são esse descalabro que conhecemos; o ensino deteriorou-se; o cuidado com a saúde escorregou dos institutos criados por Getúlio Vargas, que funcionavam, para um SUS incapaz de atingir seus objetivos porque as verbas públicas são mal aplicadas e servem até para sustentar a medicina privada (planos de saúde, filantrópicas (tem quem chame de “pilantrópicas”) et caterva.
É verdade que a Europa tem uma longa história de guerras intermináveis e cruéis, de colonialismo desbragado, infame e infamante. Mas civilizou-se, criou juízo, embora a Grã Bretanha ainda mantenha colônias no próprio continente, como Gibraltar e Irlanda do Norte. Nós passamos por quatro séculos de escravidão, lavação da burra, e prosseguimos na privatização do dinheiro público e na punição reservada a pobres (o julgamento de exceção do assim dito mensalão é uma exceção mesmo, bolada pelo recalcado Joaquim e seus asseclas; embora eu não duvide de muitos pecados petistas). Como e quando vamos nos libertar da dicotomia casa-grande X senzala? Meu propósito é dialogar com vocês sobre estes temas e outros que pintarem. Me ajudem. Lanço o blogue hoje, dia de festa no mar por Iemanjá, de festa no Poço da Panela por Nossa Senhora (festividade que já foi famosa e hoje está esvaziada) e também era o aniversário de minha inesquecível avó Maria Augusta. Desculpem-me as barbeiragens que ocorrerem, pois o meu domínio da internet e de qualquer bicho eletrônico é precário. Procurarei atualizar o blogue, com novas postagens, toda segunda-feira (dia da Lua).