Já comentei a quantidade de obras
interrompidas (ou abandonadas) em nosso Estado. Acrescento hoje um conjunto
concluído, mas que não funciona, composto pelos terminais integrados de Joana
Bezerra, Abreu e Lima e Prazeres. Há mais de um ano suas obras estão concluídas
após uns dez anos de atrasos (ufa!, afinal há obras concluídas), mas os
terminais continuam sem utilização e, claro, se deteriorando pelo abandono. O
que justifica tamanho desprezo pelo interesse público e pelo curto dinheiro
público disponível nestes tempos bicudos? Afinal, são mais de R$30 milhões
empatados. Prova provada de que não há o mínimo interesse das autoridades em
resolver o grave problema do transporte público
Abro espaço para o comentário do economista
Carlos Emanuel:
A
Concentração dos Mercados de Capitais no Brasil
O saldo dos chamados
títulos de renda fixa negociáveis em mercado atingiu R$ 4,84 trilhões em
Dez/15, de acordo com dados da ANBIMA (Associação Brasileira das Entidades dos
Mercados Financeiro e de Capitais). Os títulos de renda fixa são aqueles que
pagam juros aos seus detentores, diferentemente dos títulos de renda variável,
os quais constituem-se essencialmente em participações em empresas através de
ações e outros instrumentos negociados em bolsas de valores. Os papeis de renda
fixa são títulos de dívida os quais são distribuídos e negociados em mercado,
diferenciando-se também dos empréstimos e financiamentos diretos dos bancos. Do
estoque total de títulos de renda fixa, R$ 2,48 trilhões, ou 51%, representavam
títulos públicos, aqueles que são emitidos pelo Tesouro Nacional, e R$ 2,36
trilhões, ou 49%, constituíam títulos privados, aqueles emitidos por empresas e
instituições financeiras.
Se tomarmos a
composição dos títulos privados, a sua maior parte é constituída de títulos
bancários. Cerca de R$ 1 trilhão, ou 42% do total, representavam em Dez/15 títulos
de dívida emitidos por bancos, como CDBs (Certificados de Depósito Bancário) e
Letras Financeiras, enquanto R$ 606 bilhões (26% do total) constituíam títulos
de crédito, e R$ 753 bilhões (32% do total) representavam títulos corporativos.
Os títulos de crédito são aqueles que estão lastreados em ativos (imóveis, máquinas)
e receita futura (renda de aluguéis, prestações de financiamentos imobiliários).
São exemplos de títulos de crédito a LCA (Letras de Crédito Agrícola), a LCI
(Letras de Crédito Imobiliário), o CRI (Certificados de Recebíveis
Imobiliários), entre outros. A maior parte dos títulos de crédito é emitida
pelos próprios bancos. Este é o caso da LCA e da LCI, cujo saldo total em
Dez/15 somava R$ 397 bilhões, ou 2/3 do total de R$ 606 bilhões de estoque de
títulos de crédito no mercado. No caso da LCA, os bancos utilizam os recursos
captados no mercado para financiar o agronegócio, enquanto que na LCI os
utilizam para operações de financiamento imobiliário. Já os títulos
corporativos, que representavam apenas 32% dos títulos privados, são aqueles
emitidos no mercado por empresas, como as debêntures (títulos de longo prazo) e
as notas promissórias (títulos de curto prazo).
Os dados acima denotam
duas anomalias principais: uma é a desmesurada participação dos títulos
públicos no total de títulos de dívida no mercado (51%), e a outra é a pequena
participação dos títulos corporativos (emitidos por empresas) neste mesmo total
(15%). A primeira anomalia é resultado de três fatores: a) o baixo
desenvolvimento do mercado de capitais no Brasil, especialmente no que se
refere a títulos de dívida privada negociáveis, b) a má gestão fiscal, com o
governo mostrando-se incapaz ao longo dos últimos anos de gerar economias para
cobrir minimamente os juros da dívida, e c) a concorrência desigual com os
títulos corporativos, já que os títulos públicos atraem investidores
estrangeiros através da redução de imposto de renda na remessa de juros. A
segunda anomalia (baixa participação dos títulos corporativos) decorre em parte
do próprio tamanho desmesurado da dívida pública, cujos títulos concorrem no
mercado pela preferência dos investidores, e em parte por outras distorções do
mercado financeiro brasileiro, como a altíssima proporção de recursos
subsidiados via BNDES e outros financiadores públicos, objeto de meu último
artigo.
Apenas para dar uma ideia
destas proporções, dados da SIFMA (Securities Industry and Financial Markets
Association) para o mercado americano apontam que os títulos emitidos pelo
Tesouro representaram 33% do saldo gigantesco de US$ 40 trilhões em títulos de
renda fixa naquele mercado no final de 2015 (versus 51% no Brasil). Os títulos
corporativos de prazo acima de 1 ano, por sua vez, atingiram um saldo de US$
8,2 trilhões, equivalentes a 46% do PIB americano, enquanto que no Brasil estes
títulos representaram apenas 12% do PIB. Quando comparamos o tamanho do mercado
de títulos corporativos relativamente ao de títulos do Tesouro, representa 62%
nos Estados Unidos e apenas 30% no Brasil. É certo que o mercado americano não
é a melhor comparação, dado o seu alto grau de desenvolvimento, mas permite uma
avaliação relativa mínima.
Um mercado robusto de
títulos de dívida corporativa é essencial para as empresas, reduzindo sua
dependência de empréstimos bancários, diversificando o seu leque de credores,
permitindo redução de custos financeiros, e o acesso a recursos de longo prazo
para investimentos. Para fomentar este mercado, são necessárias algumas medidas,
entre as quais destaco 3: a) reduzir a proporção de recursos subsidiados no
sistema financeiro, direcionando-os seletivamente de acordo com o tamanho e
renda média dos tomadores, como apontei em meu último artigo; b) criar para os
títulos corporativos incentivos similares aos que existem hoje para
investidores estrangeiros adquirirem títulos do Tesouro; e c) fomentar a
participação do BNDES e outros bancos públicos no mercado, reduzindo seus
financiamentos (conforme o item a. acima) e utilizando estes bancos para
prestar garantias em emissões de títulos de empresas que de outra forma não
teriam acesso ao mercado de capitais.
Os investidores
estrangeiros detêm hoje 20% do total de títulos do Tesouro em circulação, e
simplesmente não compram títulos corporativos, pois estes não são
financeiramente atrativos por conta da carga tributária. Eliminar o incentivo
não faz sentido, pois tem atraído as aplicações de fundos estrangeiros, o que
cria uma concorrência saudável e necessária com os fundos administrados por
bancos brasileiros. Para que se tenha uma ideia, do total de R$ 1,4 trilhão em títulos
de renda fixa sob gestão de instituições administradoras de fundos (os chamados
asset managers), uma proporção inusitada de 82% estava nas mãos dos 5 maiores.
Estes 5 maiores são subsidiárias dos 5 maiores bancos brasileiros,
constituindo-se, portanto, em um oligopólio quase impenetrável na compra dos
referidos títulos. O incentivo à entrada dos fundos estrangeiros no mercado de
títulos corporativos, por consequência, me parece uma medida apropriada e na
direção correta de fomentar a competição.
Já a participação do
BNDES e outros bancos de fomento na prestação de garantias na emissão de
títulos corporativos, permitiria o acesso a este mercado a um número muito
maior de empresas, as quais não têm condições de participar hoje em função de
seu porte.
Carlos Emanuel