Além da crise que abala o
mundo desde 2008, atualmente intensificada, e que no Brasil não é mais aquela
marolinha de que falava Lula, o Nordeste ainda tem de enfrentar uma prolongada
e cruel estiagem. O ex-presidente tinha razão quando queria dizer que a crise
não mexia muito com o o nosso país naquela época, devido ao aprumo financeiro
conquistado. A seca porém não depende de equilíbrio econômico-financeiro. Mas é
preciso levar em conta que regiões muito mais secas do que o Nordeste e parte
de Minas, como o Texas (EUA), o Estado de Israel, convivem com o fenômeno
natural através de práticas de irrigação, de armazenagem de água e de uma
agricultura adaptada à região. Os israelenses se orgulham de haver transformado
o deserto em oásis.
No Brasil, um país sem projeto
(já teve, mas perdeu) e herdeiro do escravagismo, de uma história política de
golpes (Maioridade, República, Estado Novo, 1964 etc.) e do constante conluio
dos herdeiros das capitanias e sesmarias contra o povo, o fenômeno das secas
vem sendo tratado malandramente, como fatalidade, castigo de Deus, e constitui
um achado para os que vêm embolsando verbas públicas e propinas há muito tempo.
A diferença atualmente é que investiga-se e pune-se a malandragem, embora ainda
haja muita coisa a investigar e punir. Outra tronchura: a punição é seletiva.
Malandragens tucanas ainda ganham a proteção de magistrados.
No começo do século passado,
foi criada a Inspetoria Federal de Obras contra as Secas (Ifocs, que depois
virou Departamento, o Dnocs). Pouco depois, o Ifocs era traduzido como “Imensos
furtos operados contra os sertanejos”. A coisa vem de longe, não foi inventada
pelo PT, embora este tivesse a obrigação de manter seus princípios. O processo
de privatização, no governo do xogum Fernando 2º, também conhecido como FHC,
foi uma patifaria só (vejam o livro Privataria
tucana). Claro que havia empresas a privatizar (até a Editora José Olympio
tinha sido estatizada) A ditadura adorava criar estatais para acomodar a turma
que, alegadamente, chegara para moralizar. Mas algumas empresas estratégicas,
como a Telebras, a Embratel e algumas outras, precisavam ser preservadas. Dona
Margareth Thatcher, que inventou a desestatização lá na Grã-Bretanha, fez um
processo de privatização decente, com pulverização de ações e não entrega
literalmente a “amigos do rei” (o rei era Fernando 2º e o primeiro-ministro o
aloprado Mota).
Voltando às secas. Acredito
que hoje não se constroem mais açudes para deleite de latifundiários. Mas
sabota-se a reforma agrária, a irrigação e a construção e distribuição de
cisternas pré-fabricadas. Convém lembrar sempre, pois os mais jovens costumam esquecer
o passado, o trabalho de uma missão israelense que andou por aqui, no tempo que
a Sudene era Sudene, e deixou bons estudos (Israel é craque em convivência com
a seca). Nunca saíram da prancheta. Nem na ditadura, nem quando o Sarneystão
foi fraudulentamente ampliado, nem na dinastia dos dois Fernandos, nem nos governos
do xogum e do PT.
Pesquisem na web um caderno
especial editado pelo Jornal do Commercio (17 de setembro de 2013) sobre
a questão, sob o título “Outro Sertão é possível”. É um trabalho muito bem feito
e abrangente dos repórteres Felipe Lima, Adriana Guarda e Angela Fernanda
Belfort, com fotografias de Heudes Regis e Alexandre Gondim. Ivanildo Sampaio,
que na época era diretor de Redação do JC (hoje ele é coordenador do Comitê de
Conteúdo de todo o Sistema JC), escreveu no caderno especial sobre a ideia plantada
por Celso Furtado de convivência com a seca: “Vieram planos, vieram projetos,
foram feitos experimentos com irrigação a partir de lençóis aquíferos
subterrâneos. Ficou constatado que o Sertão é viável [...]. Um dia a Sudene
acabou, por obra e graça do então presidente Fernando Henrique e do silêncio
quase cúmplice dos nordestinos que o assessoravam. Alegava-se que a corrupção
ali grassava, mas em lugar de nominarem, julgarem e condenarem os corruptos,
preferiram o menor esforço de extinguir o órgão”.
Mais uma obra de FHC contra o
Nordeste. Ele abomina carne de bode. Também, com tripas tão insignes.
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