No tempo em que morei na Europa, ouvi muitos
comentários sobre o atrelamento do Brasil à política e aos interesses dos
Estados Unidos. Naquela época, eu não era politicamente conscientizado como
hoje. Aliás, como estrangeiro, nem podia participar da política estudantil.
Voltando ao nosso país, decidi fazer vestibular pra alguma coisa. Escolhi direito
e ciências sociais, mas o que eu queria mesmo era fazer política; nem terminei
aqueles cursos. Era o tempo pré-golpe; muito animado politicamente. Fiz
política ligado à União da Juventude Comunista (UJC), uma política bem aberta.
Foi quando alguns dissidentes começaram a se
desgarrar do Partidão (PCB) terminando por criar uma dissidência a que deram a
designação de PCdoB. Partido Comunista do Brasil era o nome do Partidão até que
o Supremo Tribunal Federal, seguindo ordens de Washington, pôs a agremiação na
clandestinidade e cassou os mandatos de dezenas de senadores, deputados,
vereadores; uma carnificina política. O argumento dos altos (!?) magistrados
foi que o partido não era brasileiro, apenas do Brasil, uma entidade
internacional.
A dissidência do PCdoB veio com três quentes
e um fervendo, para usar uma expressão das antigas. Ressuscitou o stalinismo,
condenado em congresso do PC da URSS por Nikita Krustchev, aí por 1956, e
defendia um comunismo ultra como o praticado na época na Albânia e na China.
Chegado o golpe, decidiu fazer guerrilha na selva, levando dezenas de jovens
idealistas à morte certa. Enquanto o Partidão, sabiamente, nunca aderiu à luta
armada, certo de que garotos e garotas inexperientes não tinham condições de
vencer um exército forte, bem armado e treinado pelos EUA. Mesmo assim, quando
não tinham mais a quem torturar e matar, os “revolucionários” partiram pra cima
do PCB.
Um esclarecimento. Reitero que minha política
comunista certamente se abastecia em Marx, mas o comunismo como o vejo é aquele
do livro dos Atos dos Apóstolos, comunismo
mesmo e não mero estatismo.
Aquelas observações que me incomodavam na
Europa, que se agravaram após o suicídio de Getúlio, demoraram a fazer parte do
passado, mas, já no século 21, a situação começou a mudar até o ano passado,
quando a golpearam. Em outros países da América do Sul e Caribe, alguns líderes
nacionalistas também tomaram iniciativas no sentido de defender os interesses
de seus países e guardar uma distância regulamentar do “grande irmão do norte”,
certamente grande, mas nada irmão.
O mais notório foi Hugo Chávez, com sua
veneração pelo grande libertador Simón Bolívar. Sofreu um golpe clássico dos
EUA, que mal durou dois dias e ele foi reinstalado no poder. Algo impensável
nos tempos áureos de exportação de golpes por Washington. Mesmo doente, ele não
soube preparar um sucessor à altura e a coisa piorou com a queda no preço do
petróleo. Seu sucessor Nicolás Maduro não tem o seu carisma. De todo modo, os
EUA ainda não conseguiram aplicar-lhe um golpe clássico nem aquele novíssimo
golpe pseudoconstitucional que já derrubou presidentes populares em Honduras,
Paraguai e Brasil.
Esses países recaíram num neoliberalismo
démodé e não apoiado pelo eleitorado. Na Argentina, devido à sua grande
inabilidade política, Cristina Kirchner não conseguiu eleger seu sucessor. O
que venceu as eleições lá governa como um Temer eleito. No Equador, tudo indica
que um governo popular vai prosseguir. E o pequenino e valente Uruguai continua
dando lições de democracia a esta nuestra Latinoamérica.
Com o atabalhoado Pato Donald desmanchando os
acordos comerciais costurados por Obama, a América do Sul pode encontrar mais
forças para completar sua emancipação em relação aos EUA e outros países ricos.
E no Brasil, com o golpe fazendo água, é possível que voltemos a uma política
externa de acordo com nossos interesses. Serra, Aécio e o Santo (Alckmin) terão
que ficar chupando os dedos e tramando o próximo golpe, com a indispensável
assessoria daquele sociólogo sem discípulos. Quanto ao golpista e incompetente
Temer, resta-lhe o Inferno de Dante: “Nel mezzo del camin di nostra vita, mi ritrovai
por una selva oscura, che la diritta via era smarrita” Uma selva escura,
perdido o caminho. Não merece pena. Ele amealhou muito dinheiro e tem boas
aposentadorias.
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